Antes de irmos a “Limbo”, devemos ter a perceção de que praticamente todas as atividades a que habitualmente chamamos de arte têm pelo menos um elemento diferenciador que as ajuda a transmitir uma mensagem. Na literatura é a representação de caracteres, signos ou símbolos linguísticos, como certas imagens, que correspondem a uma linguagem (aquilo a que chamamos de escrita); na pintura é a imagem estática ou pictórica; na música é o som; no teatro será, entre outras, a atuação; no cinema, até pela origem etimológica, será a imagem em movimento – esta última pode ser também obtida através de imagens estáticas.
Por essa ordem de ideias, o fator de diferenciação dos videojogos é algo a que comummente denominamos por jogabilidade, ainda que não haja um consenso em relação ao que é que a palavra signifique. Contudo, devemos ter em conta que já na literatura barroca encontramos poemas em forma de labirinto onde cabe ao leitor “montar” o poema ou até escolher por onde começar a leitura, demonstrando assim um conceito de “jogabilidade”. Aplicando esta prática ao videojogo, podemos afirmar que este é uma interação direta entre o digital e o usuário, beneficiando assim de um design de interação próprio.
Contudo, é comum englobar no significado da palavra a forma como o jogador interage com o jogo, algo que faz sentido quando se tiver em conta que existe uma forma ativa de interação. Ainda que muitos jogos chamados “cinemáticos”, tais como “The Last of Us” se apoiem em diálogos e cutscenes para carregar a história, é comum em jogos indie (com menos recursos para atores ou para criar cutscenes) esta ser contada através da jogabilidade.
Nesse capítulo, um dos recentes jogos que mais se destaca nesse sentido é “Limbo”, o primeiro jogo do estúdio Playdead, uma empresa dinamarquesa fundada por um ex-colaborador da IO Interactive (estúdio desenvolvedor dos jogos “Hitman“). “Limbo” conta já com mais de uma década de existência, depois do seu lançamento em 2010 para XBox 360. Apesar disso, até 2018 o jogo sofreu adaptações para outras plataformas, podendo atualmente ser jogado em praticamente todas as consolas e sistemas operativos (incluindo mobile). Em particular, esta crítica foca-se na versão para PlayStation 4, lançada em 2015.

O jogo começa quando o protagonista, um rapaz sem nome e que nunca fala ao longo do jogo, acorda no meio de uma floresta sombria. É simples de inferir que o próprio não sabe como lá foi parar, bem como perceber que o objetivo é escapar desse local o mais rápido possível e em segurança. Se se tentar enquadrar “Limbo” num género de jogo, o mais apropriado é mesmo o de jogo de plataformas em duas dimensões.
As típicas mecânicas destes jogos encontram-se presentes em “Limbo”: o protagonista pode ser movido para a direita ou esquerda, saltar, subir ou descer escadas e também puxar ou empurrar certos objetos. Estas mecânicas baseadas em física são usadas para ultrapassar desafios, como armadilhas, mecanismos, ou até objetos que controlam a gravidade.
Um fator que distingue “Limbo” de outros jogos e que o torna quase imediatamente reconhecível é a sua vertente visual, que compensa perfeitamente a ausência de diálogos ao longo do jogo. O design é bastante minimalista, algo que aliado aos gráficos a preto-e-branco dá ao jogo uma aura mística e tensa. No capítulo sonoro, os efeitos estão acima da média, sobretudo se se tiver em conta a pequena dimensão do estúdio Playdead. O barulho da chuva, das maquinarias e dos objetos elétricos, aliados a visuais que fazem lembrar o estilo noir, tornam a atmosfera do jogo um dos seus grandes pontos fortes.

Ainda que o jogo privilegie o desafio e a resolução de puzzles (algo que é completamente verdade e que o jogo faz de forma exímia), não é exagero afirmar que “Limbo”, à sua maneira, consegue ao mesmo tempo contar uma história, ainda que sem as muletas narrativas dos diálogos ou texto. A narrativa é contada através da jogabilidade, usando para isso um conceito a que podemos chamar de narração ambiental.
Quer isto dizer que, embora nunca seja mencionado, por exemplo, quem é o protagonista, qual o seu objetivo, quem são os rapazes que ele encontra ao longo do jogo e que lhe querem fazer mal, ou qual a origem das criaturas com quem ele se cruza, é quase impossível que, no fim do jogo, o jogador não tenha as suas teorias. O ambiente criado (estático na sua maioria) serve para ser explorado pelo jogador e, ainda que seja um jogo com níveis completamente lineares, é a interação do jogador com o jogo (aquilo que se definiu no início como “jogabilidade”) que permitirá chegar às respostas. Como cada jogador irá jogar de forma diferente, as respostas obtidas serão também distintas.
“Limbo” é um jogo relativamente curto, embora se torne difícil de quantificar as horas necessárias para passar o jogo, muito dependente de uma abordagem de tentativa e erro e de resolução de problemas. Uma média segura para um primeiro playthrough situar-se-á nas três ou quatro horas, havendo, contudo, quem consiga demorar menos de duas horas. Mais uma razão pela qual “Limbo”, mesmo fazendo uso de um ambiente linear, consegue proporcionar as mais distintas experiências.
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4 thoughts on “Jogo: “Limbo” – A arte de contar uma história através do ambiente”