“Pensar frequentemente e não conservar um só momento a recordação do que se pensa, é pensar de maneira inútil”
Leibniz
Aqui no Barrete já falei de René Descartes (1596-1650), Baruch Spinoza (1632-1677), dos filósofos empiristas ingleses e mais alguns personagens do século XVII. Pois bem, é chegada a hora de convidarmos para a discussão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), um dos maiores filósofos de todos os tempos. Nascido na cidade alemã de Leipzig, foi um homem do seu tempo e como brilhante estudioso, contribuiu para o campo do Direito, da Matemática (criando a calculadora e o cálculo infinitesimal), fez estudos no campo da Física, Política (trabalhou como diplomata e conselheiro), discutiu os costumes e foi um naturalista.
Filósofo pela somatória de todas essas atividades, tentou fazer uma síntese entre a conceção das ideias inatas de Descartes e a visão empirista de John Locke (1632-1704) acerca da sua tabula rasa. Tentou e conseguiu. Dialogando com este último, trabalhou numa tese apresentando as ideias contrárias e, podemos observar aqui o seu caráter e gentileza, no ano em que iria publicar o livro, em 1704, Locke faleceu. Leibniz abortou a publicação, que só veio ao mundo algum tempo depois, quando ele mesmo já havia falecido. O título não poderia ser mais endereçado a Locke: “Novos Discursos Sobre o Entendimento Humano“. Lembram-se do famoso título de Locke, “Ensaio Sobre o Entendimento Humano“?

A filosofia de Leibniz ampara-se no seu conceito monadológico. Mas do que se trata isso? É simples. Mónada seria substância, que vão das mais simples às mais complexas, culminando em Deus, que teria criado assim, o melhor dos mundos. Se observarmos o mundo, uma planta possui mónada, um animal irracional idem, o homem racional possui numa gradação maior e Deus, recuperando-se assim a explicação metafísica e discutindo com Descartes, que na sua teoria do conhecimento evidenciava a diferenciação das substâncias. Para Leibniz isso não fazia sentido, e devemos esclarecer também que ele avança na explicação panteísta do mundo proposta por Spinoza.
No seu livro “Novos Ensaios Sobre o Entendimento Humano”, ou “Novos Discursos“, Leibniz recupera o formato dos diálogos platónicos e faz as suas personagens Teófilo e Filaleto discorrerem sobre as suas ideias. A etimologia dos nomes não poderia ser mais adequada: “amigo de Deus” e “amigo da Verdade”. Segue um trecho destas discussões:
“Filaleto – Não consideramos as qualidades que tem o sol de branquear e de amolecer a cera ou de endurecer a lama senão como simples potências, sem nada conceber no sol que se pareça a esta brancura e moleza, ou a esta dureza: ao passo que o calor e a luz são considerados comumente como qualidades reais do sol. Todavia, bem consideradas as coisas, essas qualidades de luz e de calor, que são as perceções em mim, não estão no sol de maneira diferente que as mudanças produzidas na cera, quando esta é branqueada ou fundida.
Teófilo – [Alguns levaram esta doutrina tão longe, ao ponto de quererem persuadir-nos de que, se alguém pudesse tocar o sol, não encontraria lá nenhum calor. O sol imitado que se faz sentir no foco de um espelho ou vidro ardente, pode desconvencer as pessoas.
Entretanto, no que concerne à comparação entre a faculdade de aquecer e a de fundir, ousaria dizer que se a cera fundida ou branqueada tivesse sentimentos, ela também sentiria algo de semelhante ao que sentimos quando o sol nos aquece, e diria, se o pudesse, que o sol é quente, não porque a sua brancura se pareça ao sol (visto que quando os rostos são tostados pelo sol, a sua cor marrom se lhe pareceria também), mas porque existem na cera movimentos que têm uma relação aos movimentos do sol que as causa: a sua brancura poderia provir de uma outra causa, mas não os movimentos que ela teve, ao receber a brancura do sol.]“

Leibniz também é reconhecido como o filósofo que mais se reaproximou de Aristóteles, no tocante à discussão das substâncias e, claro, pela abrangência de suas investigações no campo das ciências. Reconheço que o pensador de Leipzig é um pouco complicado para os não iniciados em Filosofia, mas se se esforçarem encontrarão um pensamento lúcido e findo com pistas para que investiguem a influência que teve em outros dois génios da Humanidade: Sigmund Freud e a sua tese do inconsciente e Albert Einstein, acerca da teoria da Relatividade.
Estranha e carinhosamente, guardei nos meus arquivos uma prova que fiz sobre Leibniz na Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), Brasil, onde de 10 consegui 9,5. Boas lembranças dos estudos filosóficos, onde a necessidade de abstração é sempre fundamental para habitarmos o mundo do conhecimento. Mesmo para os que não são iniciados, sugiro aventurarem-se por essas matas virgens, quando atingirão um cenário paradisíaco às custas de muito trabalho.

“Enquanto Deus calcula e exerce o seu pensamento, o mundo se faz”
Leibniz
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One thought on “Leibniz: O seu conceito de Mónadas”