O livro “Mais Platão, Menos Prozac” (Editora Record, 2007, 380 páginas) de Lou Marinoff traz o subtítulo “A Filosofia Aplicada ao Quotidiano” e um enunciado do famoso escritor brasileiro Paulo Coelho: “Uma excelente iniciação para aqueles que não conseguem distinguir, nos detalhes filosóficos, o verdadeiro caminho do pensamento humano“. Pois bem, vamos destrinchar o bicho (livro).
Há uma lenda oriental que nos fala acerca de um Mestre que ficou a contemplar um cão em estado de putrefação. Os discípulos, incomodados com o mau cheiro, interpelaram ao Mestre o motivo de tão interessada observação. Ao que o sábio respondeu: “Olhem os dentes bonitos do cachorro!” Essa analogia bem serve para analisarmos este livro.
O livro é confuso, uma mistura de filosofia de almanaque com autoajuda. Lou Marinoff, filósofo, pedagogo e psicólogo, aposta numa nova modalidade profissional: o aconselhamento filosófico. A ver pela chamada de capa, como pode Paulo Coelho se arvorar a discursar sobre filosofia? Claro que a disciplina não é vedada aos não iniciados, mas para balizar um livro assim, penso que não acrescenta nada. A sua anuência é banal, não passa de comentário tolo e superficial. O adjetivo superficial casa bem ao livro. Um emaranhado de conselhos que resolverá todos os problemas dos envolvidos.

A Filosofia é um estudo sério. Requer ensimesmamento e distanciamento. É válido lembramos que devemos atravessar a “profundidade da superfície” para buscarmos algo mais nutritivo. Projetos tais “Cinema e Filosofia” não é filosofia. Ler o livro “O Segredo“, de Rhonda Byrne, não torna ninguém filósofo. Ler Paulo Coelho com todas as suas mistificações tolas é caminhar na contramão do autoconhecimento. Neste mundo cada vez mais fragmentado e efémero (pelas redes sociais), buscamos pílulas digestivas para o nosso modo de viver deprimido. Dessa forma, vão surgindo modalidades profissionais, os chamados “doutores do desespero”.
Não à toa, os livros de autoajuda transformam-se em best-sellers, pois acomodam os seus leitores em chavões otimistas, e dão-nos a impressão cada vez mais precisa de que estamos a ler algo vazio, como um pastel de vento. Os enunciados transformam-se em máximas, e destas máximas forma-se um ideário do bem viver. Mas os best-sellers da autoajuda são, nada mais, nada menos, do que produtos nas prateleiras para digestão rápida.
Neste mundo cada vez mais esquisito, a cultura transforma-se em entretenimento. Sabedoria transforma-se em comunicação para as massas. Distanciamento transforma-se em omissão. Corrupção ativa dos governantes transforma-se em benevolência do “Pai que dá o que comer ao seu povo”. Filosofia transforma-se em “Mais Platão, Menos Prozac”.

Observando mais detalhadamente o livro, comparando-o ao cão da lenda acima apresentada, percebo os dentes que são bonitos. A beleza provém de reflexões intimistas ditadas por grandes pensadores ao longo da história – e não por Marinoff – a ver, cito:
“A natureza queria que não precisássemos de nenhum grande equipamento para sermos felizes; cada um de nós é capaz de fazer a sua própria felicidade. As coisas externas não têm muita importância… Tudo o que é melhor para um homem está além do poder de outros homens.“
“O carpinteiro molda a madeira; os arqueiros moldam as flechas; o sábio molda-se a si mesmo.“
Buda
“A vida que não é examinada não vale a pena ser vivida.“
“Durante o período em que os homens vivem sem um poder comum que todos reverenciem, eles ficam no estado chamado de guerra.“
Thomas Hobbes
“Seja egoísta sabiamente.“
Dalai Lama
“Se sempre acontece de você voltar para o exterior querendo agradar a outra pessoa, certamente você perdeu o seu plano de vida.“
Epicteto
“Estou disposto a sustentar que a sina é o árbitro de metade das nossas ações, mas que ela nos deixa o controlo da outra metade.“
Maquiavel
“A massa de homens leva uma vida de desespero silencioso. O que chamamos de resignação é desespero crónico… É típico da sabedoria não fazer coisas desesperadas.“
Henry David Thoreau
“A multidão não é verdadeira.“
“Ficar liberto da crença de que não existe liberdade é, na verdade, ser livre.“
Martin Buber
“Para viver só, ou se é um animal ou um deus.“
“E, no entanto, se todos os desejos fossem satisfeitos logo que despertados, como os homens ocupariam a vida, como passariam o tempo? Imaginem essa corrida transportada para uma Utopia em que tudo crescesse por sua própria vontade e os perus assados passassem de um lado para o outro, onde os amantes se encontrassem sem demora e se mantivessem juntos sem dificuldades: num lugar assim, alguns homens morreriam de tédio ou se enforcariam, alguns brigariam e matar-se-iam uns aos outros e, portanto, criariam mais sofrimento a si mesmos do que a natureza lhes inflige assim como é.“
“O trabalho mantêm-nos longe de três grandes males: o tédio, o vício e a pobreza.“
Voltaire
“… muitas pessoas tropeçam pela vida até à beira do abismo sem saber aonde estão indo. Às vezes, isso acontece porque aqueles cuja vocação é dar expressão cultural aos seus pensamentos deixaram de examinar a verdade, preferindo o sucesso rápido ao esforço da indagação paciente sobre o que torna a vida digna de ser vivida.“
Papa João Paulo II
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