“Se vives de acordo com as leis da natureza, nunca serás pobre; se vives de acordo com as opiniões alheias, nunca serás rico”
Séneca
Lúcio Aneu Séneca, ou Séneca (4 a. C. – 65), foi um importante jurista, filósofo e homem público da sua época, convivendo de perto com os senadores e César do Império Romano. Um amante da Filosofia, fortemente influenciado por Platão, a poesia de Virgílio e outros. Adotou a prática da corrente estoica, o pensamento que buscava uma melhor forma de se viver na Grécia e que se espalhou com estudiosos do mundo Ocidental. O legado de Séneca é impressionante, as suas máximas e sentenças podem ser aplicadas no nosso quotidiano e por vezes assemelha-se até a pensamentos destes gurus de autoajuda que pipocam por aí.
Mas Séneca tem profundidade, e abordando a simplicidade na forma de se viver, indica-nos caminhos. A sua perceção filosófica indica-nos que Deus é a própria natureza, também conhecida como logos (racionalidade) e que já existe um plano racional para tudo e todas as coisas. Devemos estar fincados com os pés no chão.
Primeiro, a meditação por intermédio dos pensadores clássicos da Filosofia. Séneca estuda a disciplina e busca extrair dela conselhos e ensinamentos, adaptando-a à sua época. Interessante ressaltar o seguinte na nossa realidade: as pessoas adaptam a prática da meditação oriental nas suas vidas, muitas desconhecem a essência da prática e intentam pensar no nada. Adaptando o conselho de Séneca, e pela felicidade que tenho em trabalhar com a Filosofia, é que a verdadeira meditação advém desses estudos e adaptações de práticas nas nossas pequenas ações corriqueiras, assim sendo, trata-se de prática consciente.
Intentando o bem-estar, Séneca investiga-se a fundo e chega à conclusão da dicotomia entre a nossa interioridade e o mundo externo do qual não possuímos nenhum controlo sobre ele. Imaginemo-nos que uma situação corriqueira o deixou chateado e com bastante raiva, quase a chegar à ira. Primeiramente, é necessário investigar-se a si próprio. “Por que carrego eu este sentimento”? Depois, perceber que o que vem de fora escapa-nos ao controlo.
É a máxima que sempre uso: quando um cachorro ladrar e rosnar contra você, isso não te dá o direito de ficar de quatro a rosnar e a latir contra ele. Essa tranquilidade de espírito recebe o nome de ataraxia, que é esse estado de paz profunda, proveniente do espírito que cultivamos em nós mesmos.
Séneca dá-nos vários conselhos, todos eles muito úteis. Sugere estarmos concentrados no presente, não ansiando por um futuro que é incerto, nem ficando rememorando ou martirizando por coisas do passado. Essa investigação espiritual intenta o conhecimento de nós mesmos, lembram-se da máxima “Conhece-te a ti mesmo”? Assim, devemos ter em mente o propósito de todas as nossas ações, termos uma direção segura para caminharmos com mais tranquilidade nessa vida e tudo isso com o firme propósito de estarmos felizes e inteiros a fazer aquilo para o qual fomos vocacionados.
Ao escrever este artigo para OBarrete, estou concentrado naquilo que sou, na minha missão de vida que me faz olhar ao espelho e saber que sou um filósofo. Uma pergunta deve ser feita diariamente neste espelho: Quais são os meus valores?

Acerca do sofrimento, Séneca aponta que sofremos mais pela imaginação do que na realidade propriamente dita. Isso é bastante percetível, afinal, quantas vezes sentimos medo pelo facto de nos aguardar um dragão cuspindo fogo para nos enfrentar e, quando chegamos lá, percebemos que na verdade se tratava de uma inofensiva lagartixa? Vocês já passaram por isso? Devo olhar para os meus medos de forma racional, e apurar aquilo que é realidade ou apenas imaginação. Cito: “Nada é tão lamentável e nocivo como antecipar desgraças“.
Sobre a ambição desmedida, o filósofo tem muito para nos ensinar: devemos ter em conta os limites dessa ambição, não desejando para si ganhos materiais e status em demasia, aprendendo a conviver com o pouco que se tem e não perdendo o espírito para a opulência e para a vaidade. Alerta-nos ele que a ambição se pode transformar num vício, e devemos estar sempre atentos a isso.
Sobre o dinheiro, já é sabido aquela máxima que diz que devemos ser proprietários do nosso dinheiro, e não deixarmos que o dinheiro seja o nosso proprietário. Atinente às relações interpessoais, cuidado para não prejudicar os outros, e se a sua ambição ao fazer um excelente negócio significar que a outra parte não o faz, esta não é uma prática louvável. Verdadeiramente, você trocou o valor da amizade por valores vis, e isso faz de si um ser humano ruim. Vale a reflexão, cito: “Para a nossa avareza, o muito é pouco; para a nossa necessidade, o pouco é muito“.
“É válido procurarmos conhecer a que má e penosa servidão nos sujeitamos quando nos abandonamos ao poder alternado dos prazeres e das dores, esses dois amos tão caprichosos quanto tirânicos“.
Como podem ter percebido, Séneca é um técnico das emoções e comportamentos, a partir do controlo de si mesmo. Indica-nos os exercícios das virtudes, que a seu ver são quatro: Sabedoria (reforçando, a partir da leitura dos grandes filósofos); Temperança (que nada mais é do que a moderação de tudo o que se faz: ao comer, ao beber, ao praticar o sexo, a não reagir com impulsos); Justiça (o ideal da vida equilibrada e justa) e Coragem (aqui vai além da simples valentia, aqui significa a coragem para se viver a vida na sua plenitude. Todo santo dia eu tenho que ter coragem para me levantar da cama e exercer o meu ofício).
Todo esse corolário de preciosidades é o que se extrai da leitura de Séneca: o viver bem, em detrimento ao viver muito. Acrescento interessante e que observo neste século XXI: a indústria farmacêutica tem como intento fazer-nos todos Matusalém, mas será que viver à base de 20 drágeas diárias é o viver bem? Os nossos idosos vivem hoje para serem consumidores contumazes de drogas? Um caso para refletirmos. Leiam o acertado pensamento, cito: “Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a. Ela é abundante em prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente declinando estão entre os mais doces da vida de um homem. Mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos anos, estes ainda reservam prazeres“.
Com o propósito da vida definido, com a ataraxia advinda das práticas boas, focados no presente, só nos resta agradecer à Filosofia este grande manual da vida e cultivarmos em nós mesmos o silêncio, pois pessoas tagarelas desperdiçam energia enquanto a verdadeira meditação requer distanciamento e compreensão.
Séneca, apesar de toda a sua influência, teve um final trágico: vítima de conspiração dos súditos de César, foi instado por este a tomar veneno e assim se despedir do mundo. Deve ter refletido sobre a quantidade de anos que viveu, uma vez que os seus ensinamentos perduram até os dias de hoje pela magnificência e lucidez. Um filósofo espetacular!
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