Aqui nas Minas Gerais, Brasil, existe um provérbio que afirma que “devemos tomar o mingau pelas beiradas”. O enunciado é simples: quando nos servem um prato de mingau quente, se dermos colheradas pelas bordas a temperatura estará mais adequada. Assim sendo, tratarei aqui de Gilles Deleuze (1925-1995), filósofo francês, por acreditar que OBarrete, inconscientemente, aplica muito de suas intenções. Ao longo da minha vida de pensador, escrevendo profissionalmente, percebi também verosimilhanças e intenções.
A partir do livro “Gilles Deleuze – Sentidos e Expressões“, fruto de um seminário ocorrido na Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil (UFRJ), com destaque para Elton Luiz (UCAM/UVA), com a sua comunicação Letra G, de Gilles e Rogério da Costa (PUC/São Paulo) com a sua tese “Sociedade de Controle“.
Mas afinal, quem foi Gilles Deleuze? Foi um filósofo inovador, desmistificando as pompas e circunstâncias da filosofia académica. Trouxe o filosofar para as artes plásticas, o cinema, a literatura, o teatro, enfim, todas as manifestações artísticas, buscando sempre uma intersecção como valor do pensamento crítico. Essa abordagem ficou conhecida como pop filosofia, deixando assim os académicos da cátedra torcendo o nariz.
No campo da Filosofia, Deleuze esclarece o valor literário poético do alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), que inaugurou (ou reinstaurou) uma forma de fazer filosofia por meio de poemas e aforismos, quebrando aqueles elos do pensamento racionalista de René Descartes (1596-1650) e do castelo metafísico proposto por Hegel (1770-1831). Nietzsche foi genial ao publicar seu pensamento de forma artística, antes de mais nada.
Observando o mundo à nossa volta, Deleuze valoriza as imagens do mundo. Essas que nos defrontam o tempo inteiro. Imagens do mundo e imagens da vida, sendo a percepção de cada indivíduo indispensável ao entendimento completo da sua existência. Mais do que um filósofo ditando os modos comportamentais e morais, a sociedade necessita é de intercessores que investiguem as próprias condições do mundo, com os seus desafios. Desaparece a figura do pensador acabrunhado e surge a do professor investigativo.
A respeito da vida, Deleuze admite certo desencanto com a mídia, com a televisão e a cultura de seu tempo. Desiste de aparecer na televisão, mas, contraditoriamente, grava uma entrevista com a mórbida recomendação de que fosse exibida somente após a sua morte. Quase uma forma irónica de lidar consigo mesmo. Daí o “Abecedário de Gilles Deleuze“, que assisti e gostei muito. Mais do que uma entrevista formal, trata-se de depoimentos aparentemente desconexos seguindo a ordem alfabética, onde discorre sobre seus temas.
A provocação (intersecção) é feita pela aluna Clair Parnet, no ano de morte do pensador. Uma das concepções mais belas de Deleuze é a relação entre a vida e a morte, entendendo que esta última poderia levar muito pouco do indivíduo que fizesse uma carreira de busca e objetivos constantes.
Segundo Elton Luiz, cito: “Uma vida é feita de pontos singulares e ordinários; do mesmo modo, há pensamentos singulares e ordinários. Singular é aquilo que é notável. Num pensador, notáveis devem ser suas ideias, não a sua pessoa. É preciso muitas vezes uma quantidade formidável de ideias ordinárias para se produzir uma única ideia singular e notável.
Se olharmos o círculo da nossa vida, os momentos onde nós o apoiamos sobre pontos singulares são exatamente aquele aos quais experimentamos alguma mudança, encontramos uma tangente – como linha de fuga. O universal não existe. O mesmo já não se pode dizer do ordinário: este é o comum. Não o bom senso, mas a ordinaridade é o elemento que mais se partilha entre aqueles que algum poder tiraniza.“
O que isso tem a ver? Tudo. Grandes pensadores foram reconhecidos pela originalidade de suas ideias, tais Albert Einstein e a Teoria da Relatividade; Charles Darwin e a Teoria da Evolução das Espécies; Sigmund Freud e a Teoria do Inconsciente e outros.


Mais do que uma filosofia encastelada nas prisões do dogmatismo, Deleuze nos convida a comparar, a diagnosticar, a fazer filosofia no simples ato de se manifestar. Como faço ao escrever este ensaio. Deleuze estilhaça as grandes teorias e faz uma ponte originalíssima daquilo que passou a se chamar filosofia pop. Dos livros de Deleuze, vale a pena ler “O Anti – Édipo” e “O que é Filosofia?“, escrito em parceria com Félix Guattari.
Finalizo afirmando que aos poucos oferecerei um prato de mingau mais morno, descrevendo as obras e pensadores aqui descritos. Como propedêutica, essa abordagem de Deleuze é para exemplificar a feliz experiência que é OBarrete, que por meio dos seus articulistas abordam o todo da cultura e manifestações humanas. Talvez os articulistas não saibam, mas estão fazendo filosofia.
Na foto abaixo, estou no Louvre à frente de uma tela do genial Rembrandt. Sim, estou filosofando…
