OBarrete

Porque A Arte Somos Nós

O género dos walking simulators é um dos mais controversos e polarizantes no meio dos videojogos. Enquanto que muitas vezes o termo é usado como insulto para criticar jogos com reduzida dificuldade e sentimento de desafio, por outro lado, é um género onde emergem obras que valorizam acima de tudo a exploração, a descoberta e a narrativa.

Não havendo regras bem definidas para aquilo que é um walking simulador, algo que caracteriza este género de jogos é o reduzido vocabulário em termos de interatividade. Tipicamente são jogos onde é controlada uma personagem na primeira pessoa e onde as ações se resumem a andar (com o teclado ou o manípulo esquerdo do comando), olhar em redor (com o rato ou o manípulo direito do comando) e a um ou mais botões para interagir com o ambiente (como abrir portas ou pegar em objetos).

Apesar de fazerem uso de um conjunto limitado de verbos, os walking simulators são jogos que, quando bem feitos, conseguem dizer muito e fazê-lo bem. Para celebrar o género são deixadas cinco recomendações e algumas menções honrosas que procuram destacar os melhores walking simulators dos últimos anos:

“Gone Home”

5.° “Gone Home” (2013), desenvolvido e distribuído pela The Fullbright Company

“Gone Home” é o jogo mais antigo da lista, lançado num período onde a indústria e os jogadores ainda não tinham abraçado por completo o género dos walking simulators. Passado no ano de 1995, em “Gone Home” o jogador entra na pele da jovem Katie, que regressa à sua casa na zona rural de Oregon, encontrando-a completamente vazia. O objetivo do jogo é conseguir analisar as pistas deixadas na casa de forma a perceber o que terá acontecido. Embora, tal como é característico dos walking simulators, a vertente interativa seja reduzida, o jogador tem liberdade para explorar todas as divisões da casa ao seu ritmo e examinar diversos itens deixados para trás (como objetos ou notas).

Ainda que determinados itens sejam necessários para ganhar acesso a algumas divisões da casa, grande parte da exploração dos objetos, notas e diários de áudio são opcionais, mas extremamente gratificantes. A forma como a equipa de desenvolvedores conseguiu gerir a narrativa, que evolui de forma não linear e diferente para cada jogador (pois cada um pode explorar a casa por uma ordem distinta), merece todo o apreço, bem como a sua narrativa per si, que, não só apresenta personagens sólidas, como consegue tocar em temas LGBT numa altura em que estes não eram tão ubíquos na indústria dos videojogos.

Disponível em: iOS, Linux, MacOS, Nintendo Switch, PS4, Xbox One, Windows

Trailer


“The Vanishing of Ethan Carter”

4.° “The Vanishing of Ethan Carter” (2014), desenvolvido e distribuído pela The Astronauts

Logo no início de “The Vanishing of Ethan Carter” é apresentado um ecrã preto onde se lê a mensagem “este jogo é uma experiência narrativa que não te dá a mão“, um aviso que deixa o jogador desde já alertado para aquilo que se avizinha. Após um curto prelúdio em forma de voice-over, o jogador, controlando o famoso Detetive Paul Prospero, tem que procurar desvendar o mistério do desaparecimento de Ethan Carter e, mais tarde, dos restantes membros da sua família.

As principais mecânicas do jogo, suportadas pela exploração em estilo open-world, estão sobretudo ligadas à análise de cenas do crime. Indiciado pela mensagem introdutória, os elementos de jogabilidade nunca são explicados de forma condescendente ao jogador, acabando este por perceber que, em cada cena do crime, deve encontrar os objetos relevantes e, posteriormente, recriar a sequência temporal dos eventos ligados a essa morte.

A decisão do jogo em não dar a mão ao jogador, permite que este consiga analisar o mundo ao seu ritmo, sem limites de tempo ou de espaço. Contudo, o jogo acaba por contradizer as suas regras, dado que, por exemplo, impede o jogador de resolver os crimes pela ordem que quiser. Apesar de tudo, como em muitos walking simulators, “The Vanishing of Ethan”, além de narrativamente ser exemplar, proporciona uma experiência que nunca seria tão eficaz noutro meio que não o dos videojogos.

Disponível em: Nintendo Switch, PS4, Xbox One, Windows

Trailer


“Everybody’s Gone to the Rapture”

3.° “Everybody’s Gone to the Rapture” (2015), desenvolvido pela The Chinese Room e distribuído pela Sony

“Everybody’s Gone to the Rapture” passa-se na cidade fictícia de Yaughton, em 1984. O papel do jogador é o de explorar a pequena vila e perceber porque é que a vila se tornou um lugar deserto. Em vários pontos da cidade, esferas de luz flutuam no ar e permitem ao jogador visionar vários eventos passados. Seguindo as esferas que permitem reviver momentos como chamadas telefónicas, emissões de rádio e conversas passadas, o jogador começa a conseguir juntar as peças do principal acontecimento que tornou a cidade deserta e a que os seus habitantes chamam “the rapture“, uma doença que se espalhou pelos habitantes da cidade.

A interação com o mundo é feita através da exploração e, sobretudo, através da audição e visionamento desses eventos passados. Em muitos momentos não resta mais nada ao jogador do que largar o comando e ouvir os residentes de Yaughton a falar uns com os outros. Esta poderia ser uma das maiores falhas do jogo, não fosse a capacidade do jogo para cativar o jogador a montar as peças do puzzle, tendo ainda tempo para se debruçar sobre questões religiosas e filosóficas. Para os fãs de walking simulators, “Everybody’s Gone to the Rapture” é um jogo essencial.

Disponível em: PS4, Windows

Trailer


“Virginia”

2.° “Virginia” (2016), desenvolvido pela Variable State e distribuído pela 505 Games

“Virginia” pode ser considerado o videojogo mais minimalista desta seleção por vários motivos. Em primeiro lugar, a sua história descarta completamente a utilização de diálogos, no sentido em que as personagens conseguem comunicar entre si, sendo que o jogador não as consegue ouvir. Adicionalmente, é o mais linear destes cinco jogos, proporcionando uma experiência similar para quem quer que o jogue.

O grande mérito do jogo é a capacidade para compensar a falta de comunicação oral (que, por motivos de orçamento, impediu a desenvolvedora de incluir atores) com os restantes elementos, como o argumento, montagem, interação e banda sonora. Em termos narrativos, a sua história pode situar-se no género thriller e mistério, onde a Agente do FBI Anne Tarver juntamente com a sua parceira Maria Halperin, têm de investigar o desaparecimento de uma criança no estado de Virginia, no ano 1992.

Embora seja um videojogo próximo de uma experiência cinematográfica (dada a pouca interação e duração aproximadamente de duas horas), o facto de dar tempo ao jogador para analisar o ambiente e de o fazer na primeira pessoa, transmite um impacto emocional que não pode ser replicado num filme ou episódio de TV. Analisado como um todo, “Virginia” prova que as limitações de recursos são uma grande oportunidade para ser criativo e inovador.

Disponível em: MacOS, PS4, Xbox One, Windows

Trailer


“What Remains of Edith Finch”

1.° “What Remains of Edith Finch” (2017), desenvolvido pela Giant Sparrow e distribuído pela Annapurna Interactive

Em “What Remains of Edith Finch”, a protagonista Edith regressa à antiga casa da família Finch nas Ilhas Orcas, uma casa abandonada, dado que todos os membros da família já faleceram, sendo Edith a última pessoa viva. Este regresso à casa espoleta várias memórias da infância de Edith, permitindo-lhe a ela (e, consequentemente ao jogador) recordar como é que cada membro da família faleceu. Em termos de jogabilidade, o papel do jogador é o de ir explorando as divisões da casa e interagir com os elementos que vão acionando as memórias de Edith.

O grande aspeto diferenciador do jogo e aquilo que o impede de ser apenas mais um walking simulator é o facto de cada memória ser uma sequência jogável com um estilo e jogabilidade distintos e muito próprios. O resultado é uma combinação antológica destes pequenos “minijogos”, contados sob o ponto de vista de familiares de Edith, que são agregados numa narrativa maior, permitindo aos poucos dar a perceber as causas da desgraça e desmembramento da família Finch.

O jogo, ao contrário de outros deste conjunto de escolhas, é linear e leva o jogador a seguir um percurso fixo pela casa, através de vários artifícios, como portas trancadas e passagens secretas. Por um lado, esta linearidade do jogo permite um grande controlo narrativo ao nível da consistência da história e do seu ritmo. Por outro, aproxima esta narrativa mais de um filme do que de um videojogo. Apesar de tudo, “What Remains of Edith Finch” merece o primeiro lugar da lista por apresentar uma das melhores narrativas dos últimos anos.

Disponível em: iOS, Nintendo Switch, PS4, Xbox One, Windows

Trailer

Menções honrosas

  • Dear Esther” (2012)
  • Firewatch” (2016)
  • SOMA” (2015)
  • Tacoma” (2017)
  • The Stanley Parable” (2013)
  • The Unfinished Swan” (2012)

Luís Ferreira

Se queres que OBarrete continue ao mais alto nível e evolua para algo ainda maior, é a tua vez de poder participar com o pouco que seja. Clica aqui e junta-te à família!

Leave a Reply

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

%d bloggers like this: