Autor da obra prima “Ilusões Perdidas“, Honoré de Balzac (1799-1850) é um profícuo escritor. O todo da sua obra, denominada “A Comédia Humana”, impressiona pela exuberância e verborragia. Balzac reivindicou para si o título de historiador de costumes e, construindo mais de três mil personagens que povoam os seus escritos, inovou ao fazer estes personagens transitarem entre as obras. Enfim, o sujeito é portentoso.
Na minha última visita a uma livraria – um dia antes do lockdown decretado pela prefeitura de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil – viajei nas lembranças e observando as pessoas no sítio, atentei para o óbvio: no dia seguinte aquele santuário e outros tipos de comércio estariam fechados. Mas o que Balzac tem a ver com isso? Explico: quando visitei a Maison de Balzac em Paris, que à época estava em obras, detive-me nos jardins, pois o portão estava aberto; fiquei ali sentado durante horas observando uma bandeira da Turquia numa embaixada e uma vista da Torre Eiffel.

Pois bem, durante o longo tempo que ali fiquei, no outono parisiense, nenhuma alma entrou na casa do escritor. Pude tirar as minhas fotografias em paz e atentei para o óbvio: triste época a nossa, em que celebridades são aquelas que vazias de conteúdo, representam e significam referências para pessoas fúteis e vazias. Corro o sério risco de parecer elitista – talvez o seja – mas esta é a minha impressão. Por vezes, a solidão de se estar na casa de Balzac faz perceber o óbvio: quanto mais subimos a montanha, mais o ar se torna rarefeito e propício a poucos. Nietzsche que o diga.
Na banca de promoções da Livraria Leitura, vários volumes de Balzac estavam à venda e o todo da coleção da Biblioteca Azul (Editora) foi fracionada e depois de muita ponderação, escolhi o Volume 2, com nove livros do Mestre: “Uma Estreia Na Vida“, “Alberto Savarus“, “A Vendeta“, “Uma Dupla Família“, “A Paz Conjugal“, “A Sra. Firmiani“, “Estudo De Mulher“, “A Falsa Amante” e “Uma Filha de Eva“. Nove livros num total de 831 páginas que irei dissecar com o passar dos dias. Em breve resenhas específicas aqui para OBarrete.
O prazer advindo da literatura de Balzac faz-nos viajar pela alma dos seus personagens. Como grande cronista de Paris do século XIX, já estou embrenhado na leitura de “Uma Estreia Na Vida”, e nas 60 páginas iniciais já me apercebi da história contextual, a constituição da riqueza de um conde, as fraudes de um administrador que se perdoa pelos malfeitos, a viagem do jovem Óscar que irá empreender uma jornada em busca de um futuro e, por enquanto, nada mais posso dizer.

Como narrativa que nos acompanha durante, e notadamente depois, fico ansioso para saber os desfechos, e por mais que as novelas balzaquianas atentem para o drama, confesso que morro de rir pela sua fina ironia ao descrever algumas fraquezas de caráter.
Lendo os clássicos, há muito vivo o meu lockdown particular. Como se estivesse nos jardins da Maison de Balzac e quem sabe um dia eu escreva sobre os nossos dramas atuais (a covid-19, desemprego em massa por conta do fecho do comércio, autoridades batendo cabeça e estupidez galopante por esse mundo fora), mas com uma pitada de fina ironia?
O certo é que o momento atual irá requerer ensimesmamento, concentração e reminiscências de uma época em que podíamos viajar livremente, mas felizmente, impregnei-me tanto da casa de Balzac que, agora ao ler os seus escritos, parece que estou a conversar com o próprio, sentado ao seu lado num dos seus verdes bancos.
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One thought on “Balzac para ir passando os dias”