José de Sousa Saramago, neto de camponeses, nasceu na Azinhaga, no Ribatejo, foi serralheiro mecânico e subdirector do Diário de Notícias, e é o nosso único Nobel da Literatura da história. Mas, uma das coisas mais fascinantes a constatar nele é o facto de só ter começado a escrever de forma independente a partir dos 50 anos. Entre os primeiros livros e este “salto” passaram umas décadas, onde o próprio afirma “não ter tido nada para dizer“.
É, ademais, um escritor polémico, sobretudo pela sua escrita invulgar, que subverte as regras ditas gramaticais; tornou a língua prática: usa apenas a vírgula e o ponto… “São as duas sinalefas que pautam uma melodia – uma pausa curta e uma pausa mais demorada“. Qual o objectivo? Tornar o discurso mais oral, e eliminar, o máximo possível, a barreira entre o escritor e o leitor.
Por outro lado, as origens do apelido Saramago dizem respeito à alcunha de família, Saramago, que é uma planta herbácea com flor que cresce na região da Golegã. No dia do registo do seu nascimento, o senhor responsável registou, de forma errónea, a criança, precisamente, com a alcunha pela qual era conhecida a sua família. Foram dificuldades económicas que impossibilitaram José Saramago de seguir estudos universitários. No entanto, formou-se numa escola técnica e teve o seu primeiro emprego como serralheiro mecânico.

Em 1992, o Secretário de Estado da Cultura vigente, Sousa Lara, vetou a obra “Evangelho Segundo Jesus Cristo“, como afronta a um património religioso em causa. Em resposta, Saramago, “só” disse: “O drama não é que as pessoas tenham opiniões. Isso é óptimo. O drama é que as pessoas tenham opiniões sem saber do que falam“.
Foi acusado de dividir os portugueses, mas sempre ciente que tudo não passou de uma mera irreflexão e estupidez política. Foi uma violência que despoletou uma saída de Portugal: que não foi um corte com o País, não foi um exílio, mas sim uma revolta. Nesta obra, Saramago faz uma caricatura à Bíblia, a qual afirma ser “um manual de maus costumes.”
Além disso, a 29 de Junho de 2007 cria a Fundação José Saramago, a fim de defender e difundir a Declaração Universal dos Direitos Humanos e apelar à resolução dos problemas do meio ambiente. Saramago foi, também, alvo do estatuto de responsável pelo efectivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.
Estamos a falar de um autêntico visionário, que era sempre fiel aos seus pensamentos e convicções, não deixava ninguém limitar a sua liberdade de expressão e criativa, conseguindo sempre transpor nos seus romances metáforas repletas de sabedoria, audácia, paixão e compromisso para com a história, a vida e a arte.
Entre inúmeras coisas, destacam-se algumas frases em vida que merecem mais que uma mera atenção: “Aquilo que vier a ser meu às mãos me há-de vir ter (…) Provavelmente tenho tudo porque nunca quis nada“. Decerto, algumas das epigrafes dos seus livros são também elas dignas de um enaltecimento, mesmo que breve: “Se podes olhar, vê; se podes ver, repara“, (“Ensaio sobre a Cegueira“), ou “O caos é uma ordem por decifrar” (“O Homem Duplicado“).


O seu livro “Ensaio sobre a Cegueira” foi adaptado ao cinema com o filme “Blindness“, lançado em 2008 e dirigido por Fernando Meirelles, realizador do filme “Cidade de Deus” (2002). Também o seu livro “O Homem Duplicado” teve uma adaptação, “Enemy“, filme de 2013 dirigido por Denis Villeneuve – conhecido por filmes como “Raptadas” (2013) – protagonizado Jake Gyllenhaal – este último conhecido por filmes como “Nightcrawler – Repórter na Noite” (2014).
Como podemos ver, estamos a falar de um mestre das letras e da escrita, que não precisou depender de ninguém para chegar onde chegou. Este deixa-nos uma de muitas lições importantíssimas: “O teu sucesso chegará com tranquilidade. Se fores realmente bom, aquilo que és é o passaporte para um novo mundo de oportunidades“. Como diria outro génio, “põe tudo o que és no mínimo que fazes“.
Saramago demonstrava, desde muito cedo, um interesse profundo pelos estudos e pela cultura, e foi precisamente essa curiosidade perante o Mundo que o fez chegar mais longe e que, efectivamente, o acompanhou até à morte. José Saramago foi reconhecido por utilizar um novo estilo oral e uma nova linguagem, sob a ideia de que a vivacidade da comunicação é mais importante do que a correcção ortográfica da linguagem escrita. Utiliza, portanto, a pontuação de uma maneira pouco ou nada convencional. Esta organização propicia uma forte sensação de fluxo de consciência, ao ponto de o leitor chegar a questionar-se se um certo diálogo foi real ou apenas um pensamento.
São todas estas características que tornam o estilo de Saramago único na literatura contemporânea, sendo rotulado, de forma quase unânime por muitos críticos, um mestre no tratamento da língua portuguesa. Em 2003, o crítico norte-americano Harold Bloom, no seu livro “Genius: A Mosaic of One Hundred Exemplary Creative Minds“, considerou José Saramago “o mais talentoso romancista vivo nos dias de hoje“, referindo-se a ele como “o Mestre“. Ainda no seguimento do seu raciocínio, considerou Saramago como “um dos últimos titãs de um género literário que se está a desvanecer“.
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4 thoughts on “José Saramago: À frente do seu tempo”