Podem recordar a segunda parte de “Putinquistão” aqui!
3.ª Parte
O céu ficou plúmbeo. Há dias as notícias chegavam da Europa e dos Estados Unidos e não eram nada boas. Discutia-se a Terceira Guerra Mundial e ela acabou a ser muito mais tecnológica e fatal. Presidentes com a incumbência de acionarem os botões vermelhos das suas bombas nucleares assim o fizeram, na equação de causa e consequência. Preservados por um oceano, África e Américas sentiram as consequências com o passar dos meses.
O rasto de destruição impressionou os mais insensíveis e o Velho Mundo não existia mais. A ambição de extensão de fronteiras de um presidente russo contraditoriamente levou à morte e destruição. Das notícias que chegavam, das bandeiras desfraldadas em escombros, percebíamos que até a Península Ibérica tudo agora era russo. O nome pejorativo que deram a este Estado foi Putinquistão.
Colapso de satélites e as informações, incluindo a Internet e o sistema bancário, tudo foi à bancarrota. A sobrevivência seria o esquecimento, a ignorância, a preservação da própria vida frente a um ambiente hostil. E o planeta apresentava-se hostil. Chuvas ácidas, temperaturas que nos trópicos beiravam os 60° e um ar carregado de pestilências. A vegetação se extinguira em mais de 80% e foi nesse cenário desolador que um professor filósofo recebeu a visita de uma junta de cientistas na sua fazenda, no interior de Minas.
O ano era 2028 e Hubert convocou o fazendeiro para o célebre “Conselho de Notáveis”. Extraterrestres pensariam num modo de preservarem o que havia restado do planeta Terra e uma das suas preocupações era o acervo histórico e cultural que não podia ser perdido. Afirmava ele que Sócrates, Jesus, Dante Alighieri, Shakespeare, Newton, Darwin, Bertrand Russell e outros não poderiam simplesmente desaparecer com os seus respetivos legados.





A atribuição conferida a Luiz era a de copista, guardador deste tesouro até que o planeta voltasse a reviver num futuro próximo. Estranhamente, o fazendeiro assimilou a sua função e no teletransporte chegou a 2122. E acerca do “Conselho de Notáveis”, ele era mais do que a simples leitura de obras e estudos. Na reencarnação religiosa tida há muito por superstição, lá estavam os grandes da História da Humanidade e foi tácito o entendimento de que não eram e nunca foram pessoas deste mundo. Luiz riu ao se lembrar das falas de Sócrates e Jesus, quando estes falavam do mundo ideal e da casa do Meu Pai.
“Então tudo era uma sabedoria simples que professavam e a grande maioria de nós, sempre desconfiando das utopias e daquilo que é também simples, desconfiávamos e condenávamos estes mestres a uma taça de cicuta e a cruz. Muitos tiveram que sacrificar o próprio corpo para fazerem viajar as suas ideias, e o tempo era isso, aquilo que perdura para além de uma efêmera existência.“
Com ambrosia conversavam e discutiam os destinos da Terra, se haveria a possibilidade de uma recuperação, se a vida voltaria a jorrar em todo o seu esplendor, ou se a outrora esfera azul se desmantelaria no Universo. O tempo cronológico era uma coisa, o imemorial era outra e da mesma forma que todo o Universo poderia caber numa casca de noz, todo o tempo existente na Terra não passava de um milésimo de segundo na vida dos multi-Universos.
Caberia a Luiz registar isso para povos alienígenas, uma vez que na Terra o distanciamento e a opacidade do Sol, impenetrável na atmosfera devido a um cobertor radioativo e à consequente morte dos seres vivos, ficando alguns símbolos como a cara de um ditador que pretendeu tanto estender os seus domínios que se transformou em Midas, o rei que em tudo tocava e transformava em ouro. Neste caso, o dirigente do Putinquistão teve o demérito de transformar tudo em ruínas e cinzas.
Luiz despediu-se do “Conselho” e foi dormir. Ao seu lado, Protágoras ronronava sossegadamente.
Epílogo
Ao acordar, e como era hábito no convívio com Flores, Luiz levantou e foi fazer café, aguar as plantas e dar milho às galinhasporcos. Enquanto bebericava o café, assistia ao noticiário na televisão e o clima era todo benfazejo. Sabia que as bandeiras e fronteiras haviam sido unificadas e como logotipo apenas a letra H de Humanidade. O ano era 2045 e do chip retirado não se lembrava de mais nada, das viagens interestelares e na máquina do tempo. Adepto do conhecimento, recebeu a esposa com um abraço e reforçou o café com ela. Conversaram trivialidades enquanto ela afirmava preparar-se para a pesquisa com girinos no tanque improvisado.
Conhecidos na região como o casal filósofo e cientista, nada mais natural que tivessem uma linda menininha de nome Sofia, que ainda dormia…
Se queres que OBarrete continue ao mais alto nível e evolua para algo ainda maior, é a tua vez de poder participar com o pouco que seja. Clica aqui e junta-te à família!