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Dizer que “Everybody’s Gone to the Rapture” é um walking simulator pode ser suficiente para que um jogador minimamente familiarizado com o género possa saber o que esperar do jogo. Possivelmente antecipará uma experiência com ênfase mais narrativa, onde a jogabilidade terá mecânicas reduzidas, como a exploração e, com sorte, alguns botões para interagir com itens do ambiente. De facto, “Everybody’s Gone to the Rapture” partilha muitas das características associadas a este género algo polémico de jogos, indo buscar muito daquilo que a desenvolvedora (The Chinese Room) apresentou num dos seus títulos anteriores, “Dear Esther“, sem fugir muito ao modelo do típico walking simulator.

“Everybody’s Gone to the Rapture” passa-se em 1984, na cidade fictícia de Yaughton, uma vila completamente privada de presença humana. O papel do jogador é o de explorar a pequena vila e perceber o que terá acontecido. Apesar de Yaughton se encontrar deserta, em vários pontos da cidade, estranhas esferas de luz flutuam no ar e permitem ao jogador ter vislumbres de vários eventos passados. Estas permitem reviver momentos como chamadas telefónicas, emissões de rádio e conversas passadas, que rapidamente permitem ao jogador perceber qual o acontecimento que esvaziou a cidade – um estranho evento a que os seus habitantes apelidam “the rapture”, uma doença que se espalhou por toda a comunidade.

“Everybody’s Gone to the Rapture” passa-se na cidade fictícia de Yaughton, completamente deserta

A interação com o mundo é feita através da exploração e, sobretudo, através da audição e visionamento desses eventos passados. É dada ao jogador alguma liberdade para explorar as várias zonas da cidade pela ordem que lhe interessar, visto que a narrativa já está pensada para ser contada de forma não cronológica, não fazendo grande diferença os segmentos da história que são ouvidos em primeiro lugar. Apesar de tudo, o jogo consegue afunilar em momentos estratégicos, de forma a garantir que algumas conversas chave são ouvidas em alturas que garantem consistência narrativa e impacto emocional.

Quase todos os momentos de diálogo são opcionais, contudo, grande parte da história que o jogador médio vai experienciar diz respeito a dois cientistas, Stephen Appleton e a sua mulher, Katherine Collins. Ambos se conheceram nos Estados Unidos, tendo depois decidido mudarem-se para Yaughton, terra natal de Stephen, para trabalharem no observatório Valis e estudarem teorias astronómicas relacionadas com a deteção de padrões numéricos nas estrelas. Sendo Yaughton uma pequena vila, o restante elenco de personagens inclui vários familiares e conhecidos de Stephen, algo que permite que todas as histórias se interliguem, por mais que pareçam meros side plots.

No jogo, o jogador pode ver e ouvir conversas passadas entre os habitantes da vila

Quando o jogador ‘desbloqueia’ a reencenação de conversas entre as personagens de Yaughton, apenas consegue ouvir as suas vozes, com um ligeiro suporte visual das esferas de luz, que apresentam vagos contornos dos corpos das personagens, o que faz com que muito do poder destes momentos recaia no voice acting. Felizmente, é uma das principais valências do jogo, com um conjunto de performances vocais de rara qualidade no mundo dos videojogos.

Adicionalmente, nos muitos momentos em que o jogador simplesmente vagueia pela cidade, a excelente banda sonora, original, tem os seus momentos de destaque, tornando-se quase uma personagem do próprio jogo. É um conjunto de melodias tão poderosas que talvez tenham estado na origem de uma das decisões mais polémicas do jogo, estas relacionadas com a escassa velocidade com que o jogador pode caminhar, como se fosse uma forma da equipa criativa forçar a pessoa a escutar a banda sonora.

Em muitos momentos do jogo, não resta mais nada ao jogador do que largar o comando e ouvir os residentes de Yaughton a falar uns com os outros, a deixarem mensagens de voz num gravador ou simplesmente a dialogarem consigo próprios. Esta poderia ser uma falha grave de uma obra que se quer intitular de videojogo, não fosse a capacidade de “Everybody’s Gone to the Rapture” em cativar o jogador a montar as peças do puzzle, a ser curioso, tendo ainda tempo para se debruçar sobre questões religiosas e filosóficas. Para os fãs de walking simulators, “Everybody’s Gone to the Rapture” é um jogo absolutamente essencial.

Disponível em: PS4, Windows

Luís Ferreira

Rating: 3.5 out of 4.

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