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Num presente onde os lucros do mercado dos videojogos são maioritariamente alavancados por lançamentos focados em experiências multijogador online, a Hazelight Studios continua a carregar às costas o peso de ser dos poucos estúdios focados em jogos multijogador cooperativos offline (denominados na gíria de jogos couch co-op). Para o seu sucesso muito tem contribuído a equipa liderada por Joseph Fares, fundador da Hazelight e seu diretor criativo.

O primeiro jogo dirigido por Fares (na altura a trabalhar na Starbreeze Studios) foi “Brothers: A Tale of Two Sons” que, embora tenha sido desenvolvido para ser jogado apenas por um jogador, permitia o controlo de duas personagens em simultâneo. Seguiu-se “A Way Out” (o primeiro jogo da recém-fundada Hazelight Studios), que deu aos jogadores uma aventura narrativa com o twist de só poder ser jogada por duas pessoas em simultâneo.

O jogo em que este texto se foca é “It Takes Two”, o segundo jogo da Hazelight, lançado em 2021, e que segue a filosofia de design já ensaiada com “A Way Out”. O jogo apenas funciona no modo de ecrã dividido e deve ser jogado por duas pessoas (não inclui modo single-player), embora os dois jogadores possam fazê-lo de forma local ou online, com a particularidade de apenas um deles ter que adquirir o jogo.

“It Takes Two” é um jogo cooperativo exclusivamente jogado em modo de ecrã dividido (split screen)

Em “It Takes Two”, os dois jogadores controlam Cody e May, um casal prestes a iniciar o processo de divórcio. Quando Cody e May contam à filha Rose que estão a pensar em se separar, esta acaba por inadvertidamente lançar uma espécie de feitiço (que o jogo não se preocupa muito em justificar) e faz com que os pais fiquem presos no corpo de dois dos seus bonecos. Para os ajudar a recuperar os seus corpos, ambos encontram o Dr. Hakim, uma versão antropomórfica do livro de terapia de casais que Rose comprou para tentar solucionar a má relação dos seus pais.

Estando presos em corpos estranhos e de dimensão diminuta, Cody e May têm que fazer os possíveis para voltar para os seus corpos humanos, que se encontram inconscientes. Usando as dicas amorosas do Dr. Hakim o casal (e por consequência os jogadores) tem que trabalhar em conjunto para superar desafios variados, como plataformas, combate ou desafios lógicos. Num cenário exclusivamente situado na propriedade da família, Cody e May têm que percorrer vários destes locais (como o jardim, a arrecadação ou o quarto de Rose) e confrontarem-se com versões antropomórficas dos seus objetos, muitos dos quais negligenciados durante anos.

Muitos dos grandes jogos da era moderna são aqueles que triunfam na tentativa de casar narrativa e jogabilidade de forma harmoniosa, que consiga transmitir ideias ao jogador e ao mesmo tempo dar-lhe a possibilidade de fazer diretamente parte da história. No caso de “It Takes Two”, os vários locais da propriedade do casal e as personagens com que estes se cruzam (muitas das quais escolhidas a dedo pelo Dr. Hakim) servem, narrativamente, para fazer uma análise interna à relação de Cody e May, dando-lhes a possibilidade não só de perceber aquilo que de errado se passa com a sua relação, mas igualmente como forma de os forçar a trabalharem juntos.

O principal mote para a narrativa é a degradação da relação de Cody e May

De um ponto de vista focado na jogabilidade, a diversidade de situações serve como incentivo para o jogo cumprir os seus três motes: quantidade, variedade e cooperação. Quantidade porque “It Takes Two” inclui uma aventura duradoura e que permite várias sessões de jogo, tendo um tempo de jogabilidade de cerca de 14 horas, mais do dobro de “A Way Out”.

Variedade porque é verdadeiramente impressionante a quantidade de mecânicas utilizadas e experimentadas pelo jogo, não tendo pudor nenhum em lançar uma nova forma de jogar em cada capítulo, seguindo a filosofia de que quanto mais uma mecânica é repetida, menos especial se torna. Por último, cooperação porque todos os momentos de jogo não necessitam de prática ou de skill, mas apenas de um verdadeiro e genuíno trabalho em equipa.

Esta capacidade para ser diferente sem deixar de ser impactante permitiu a “It Takes Two”, embora de forma inesperada, levar o prémio de Jogo do Ano nos The Game Awards de 2021 (o equivalente gaming aos Óscares), superando-se a favoritos como “Ratchet & Clank: Rift Apart” ou “Deathloop“. Mas chamar a “It Takes Two” o jogo do ano talvez seja dizer pouco de uma obra que é possivelmente o melhor jogo cooperativo local da década.

Disponível em: PS4, PS5, Windows, Xbox One, Xbox Series X|S

Luís Ferreira

Rating: 4 out of 4.

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