Até ao lançamento de “God of War” em 2018, ‘mudança’ nunca tinha sido uma palavra que se pudesse propriamente associar a Kratos ou à série “God of War”. Até então os seis jogos lançados apresentaram-se todos mais ou menos da mesma forma. Em termos de jogabilidade, todos estes foram muito focados no combate (usando maioritariamente as Laminas do Caos), embora estivesse sempre presente o elemento da exploração. A forma linear com que foram estruturados estes jogos permitiu um grande controlo do ritmo e a garantia de que os jogadores iriam passar por experiências similares.
Já nas suas histórias, foram seis jogos altamente influenciados pela mitologia grega, formando um conjunto de aventuras que se mostraram ligadas como um todo. Kratos desde o primeiro jogo mostrou-se um guerreiro sanguinário e implacável (com uma ou outra exceção), algo que pouco mudou de jogo para jogo. Opinou-se no artigo anterior da série que o último destes lançamentos (“God of War: Ascension“) mostrava já alguma ausência de criatividade e indícios de uma fatiga provocada pela falta de inovação.

Foi precisamente ‘inovação’ aquilo que “God of War” (2018) trouxe para a franquia. O seu grande período de desenvolvimento permitiu à equipa criativa liderada por Cory Barlog (um dos grandes nomes da Santa Monica Studios e o diretor de “God of War II“) repensar a saga reimaginando todos os seus elementos, sem perder a personalidade que lhe era associada. Esse período de desenvolvimento levou à conclusão de que a saga necessitava de um novo rumo em termos de referências mitológicas, tendo sido decidido que este novo jogo seria baseado na mitologia nórdica.
O resultado está mais próximo de uma sequela do que de um reboot, pois os acontecimentos dos jogos passados são referenciados. A história mantém-se focada em Kratos, que vive no reino nórdico de Midgard com o seu filho Atreus, fruto da relação de Kratos com a sua mulher Faye. Tanto Atreus como Faye estão ausentes de todos os jogos anteriores e não é feito um grande esforço para explicar aquilo que terá acontecido entre o término dos acontecimentos de “God of War III” e o início de “God of War”. Esta atitude pode ser lida como uma tentativa de distanciar as duas épocas: a da mitologia grega da nórdica.

Quando o jogo se inicia, Kratos e Atreus têm como missão principal espalhar as cinzas de Faye (recentemente falecida) na montanha mais alta dos nove reinos nórdicos, o seu último desejo em vida. Logo nos primeiros minutos, os dois são abordados por uma curiosa personagem (apelidada pelo jogo como “O Estranho”) que revela ter poderes de um deus e que pode ser considerado o principal antagonista da história. Para atingir o aparentemente simples objetivo de Faye, Kratos e Atreus terão que atravessar inúmeros obstáculos, conhecer diversas personagens e derrotar um sem número de criaturas e de deuses nórdicos.
Basta jogar um par de horas para perceber que “God of War” se apresenta de forma muito diferente dos seus predecessores. A um ritmo muito mais desacelerado, a história foca-se também na relação entre pai e filho, mostrando uma humanidade em Kratos raramente vista. Foram efetuadas alterações na câmara do jogo que, além de permitirem um estilo de câmara livre (em vez da câmara fixa como sempre aconteceu), fazem com que esta se situe numa perspetiva over-the-shoulder de Kratos, ao invés de adotar uma perspetiva mais distanciada, outro fator de aproximação emocional do jogador para com Kratos. Também digna de registo é a composição do jogo como um plano contínuo (ao estilo do filme “1917“), apenas quebrado se o jogador morrer.

O guerreiro espartano deixou de ser interpretado por Terrence C. Carson, substituído por Christopher Judge, numa performance igualmente fenomenal e até, diga-se, mais apropriada para esta nova versão da personagem. O filho Atreus é interpretado por Sunny Suljic, uma atuação mais sensível que complementa bem a presença de Kratos. Embora Atreus não seja controlado pelo jogador é possível ser utilizado durante o combate, algo extremamente satisfatório, sobretudo quando este começa a ficar mais forte com o decorrer da história.
Precisamente o combate, como possível fator que mais atrai os gamers para o universo, não podia deixar de ser mencionado. Muitas vezes se afirmou nos artigos anteriores (talvez com demasiada veemência) que o sistema de luta dos jogos da fase grega de “God of War” se aproximava da perfeição. Contudo, a revolução que as mecânicas de combate sofreram mantêm o novo “God of War” como uma referência de close combat, usando o novo machado Leviathan ao invés das Lâminas do Caos.
Ir-se-á mais longe e afirmar-se-á (perdoe-se a hipérbole) que o novo machado de Kratos é uma das melhores armas da história dos videojogos. Não só permite variados estilos de ataque (combate próximo ou a longa distância, pois este pode ser atirado e recuperado), como é usado por Kratos com outros propósitos, como resolver puzzles ou interagir com o ambiente. Acima de tudo, ao longo das mais de 30 horas de campanha, é sempre uma arma extremamente satisfatória de ser usada, algo digno de registo.

Também ao contrário do que era regra até então, o jogo está assente numa lógica de mundo aberto, podendo Kratos e Atreus explorar as redondezas e efetuar missões secundárias. Quebrando alguma tendência recente dos jogos open world, esta alteração pouco ou nada impacta na apreciação da história principal, pois não só as missões secundárias são interessantes e enriquecedoras, como o mundo criado não é excessivamente grande para se tornar opressor.
Sobrando poucos elementos mais para analisar, resta referir que “God of War” também prima pela excelência nos capítulos visuais e efeitos sonoros. Será difícil para qualquer jogador depois de ter esta experiência pensar num jogo visualmente mais agradável de ser jogado. Já se disse que na história de “God of War”, Kratos e Atreus tentam chegar ao topo da montanha mais alta dos reinos nórdicos. É uma boa analogia para a tentativa bem-sucedida deste jogo de se aproximar do pico de qualidade que pode ser obtida quando se fala em videojogos.
Disponível em: PS4 (original), PS5 (original, via retrocompatibilidade da PS4)
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