O filme começa com uma paisagem em ruínas. Estamos na Primeira Guerra Mundial. Os ingleses lutam contra os alemães. Há muito sangue, feridos, mortos. A esperança de todos era não morrer. Sobreviver. Porque aos que lá estão já lhes tinham sido tirado uma vida. 1917 é o ano que marca uma data que todos querem esquecer; que todos querem que acabe. Todos, por dentro, querem fugir, mas o orgulho patriota fala mais alto.
Sam Mendes, o maestro do filme — que certamente vai levar a estatueta de Melhor Realizador para casa dia 9 de Fevereiro —, é sagaz e eleva a película a um ponto em que o próprio espectador está dentro do filme. O realismo da guerra, a entreajuda (e a ganância humana)… a forma como naquele caos é possível encontrar paz, amor, carinho, compreensão, tudo isto confere a “1917” uma dinâmica bastante diferencial a outros filmes do mesmo género. Vai havendo um crescendo dramático, mas acima de tudo uma descoberta por parte de Schofield (George MacKay), o comando que, juntamente com o seu amigo (e também ele comando) Blake (Dean-Charles Chapman), é responsável por transmitir uma mensagem aos compatriotas que estão do outro lado da batalha.
É fabuloso ir apreciando a cinematográfica estonteante que nos vai sendo facultada, ir constatando as pequenas coisas, a natureza que vai sobrevivendo ao horroroso caos da guerra, e que vai dando força para continuar em frente. Uma missão que todos achariam impossível, ainda assim “só há uma maneira de ganhar esta guerra: ser o último homem a ficar de pé.” O mote para uma experiência que, dentro da desumanidade da destruição, encontra o apanágio da essência humana.
Mesmo que sozinho viajes mais rápido e que acompanhado vás mais longe, por vezes apenas tens de estar num sítio certo à hora certa. Vamos percebendo os batimentos cardíacos da sinfonia caótica ambiental, através de uma banda sonora de encher a alma, o tédio intelectual, o arrepio emocional que prende — que me prendeu — do início ao fim ao ecrã. O instinto de sobrevivência de Schofield, aliado à sua revolta interior — as saudades de casa, sobre a qual disse por vezes ser mais fácil não regressar.
É uma contemplação revitalizante, que merece ser vista no grande ecrã, e que deixa o espectador inquieto, inspirado e confortavelmente só.