“O coração tem razões que a razão desconhece”
Pascal
Lendo este pensamento de Blaise Pascal (1623-1662), podemos ter uma ideia da linha de raciocínio deste importante filósofo francês do século XVII. Físico, matemático, tinha tudo para coadunar com o pensamento do racionalista René Descartes (1596-1650), mas foi um crítico da razão infinita e do método cartesiano de se duvidar de tudo. Dizem que uma experiência acidental numa carruagem o fez ver a luz sendo ela Deus.
E que a cura de uma sobrinha que aos olhos de todos representou um milagre reforçou esse sentimento. Isso mesmo. Num século notadamente racional e científico, sendo Pascal mesmo um dos seus atores, encontra no cristianismo refúgio para muitas de suas angústias. E o quanto angustiado foi.
Naquela época, lógico, não havia especialização em Filosofia, sendo que era considerado filósofo o sujeito que se apercebia de muitas coisas. Daí a Psicologia, e Pascal foi um investigador das coisas do coração contrapondo-as à razão o tempo inteiro. Adepto do jansenismo, uma doutrina religiosa professada pelo bispo dinamarquês Cornelius Otto Jansenius, que procurava discutir as ideias de livre-arbítrio expressas por Santo Agostinho de Hipona (354-430), ele irá sentir a presença divina em tudo a que se propõe.

Daí a sua famosa aposta que consistia no seguinte: devemos crer em Deus e não sermos ateus, pois se eu acredito em Deus e após a minha morte Ele existe de facto eu terei um ganho infinito. Caso eu creia em Deus e ele não exista, ao fim não terei perdido nada; agora imaginem se eu sou ateu e após a minha morte descubro que Deus existe, aí sim eu terei uma perda infinita. Entenderam? A meu ver, ele usa de certo o pragmatismo em busca de uma solução pessoal de ganho. Muito discutível pois, até onde eu saiba, ninguém morreu e voltou do Além para nos dizer se Deus existe de facto ou não.
Uma das grandes viagens de Pascal diz respeito à admissão de que ele era uma poeira cósmica no Universo infinito. Lembremos que ele é contemporâneo de grandes cientistas, convivendo com as teses de Galileu Galilei (1564-1642), Johannes Kepler (1571-1630), tendo já estudado Nicolau Copérnico (1473-1543) e quando morre, Isaac Newton estava na flor da juventude, com os seus 19 anos. É um período de ciências, induções, experimentos, microscópios, lunetas, enfim, tudo aquilo que, aliado à razão, pretende ser o cabedal do conhecimento da humanidade.
Se Pascal se espantava com o Universo infinito, devo reconhecer que eu me espanto ainda mais. Quando assisto a alguns documentários espaciais no Discovery Channel, tenho a nítida sensação de que a Terra é um ovo frágil que está a girar ao leu e que de uma hora para outra um outro corpo espacial maior nos poderá destruir. Seria o caso de aderir à aposta de Pascal?
“O silêncio destes espaços infinitos apavora-me“
A sua profunda investigação filosófica, teológica e psicológica fizeram-no ser autor de máximas existencialistas e bastante pertinentes aos dias de hoje. Sempre a investigar-se a si mesmo, certamente influenciado pelas digressões de Michel de Montaigne (1533-1592), Pascal, este autor plural, genial e profundo, que viveu pouquíssimo tempo (39 anos), tendo falecido de esgotamento, soube eternizar as suas ideias e constar assim no panteão dos grandes pensadores da Humanidade.
Nada mais justo que findar este texto com uma seleta das suas ideias. Fica a dica, transponham para a época atual.

“O homem está sempre disposto a negar tudo aquilo que não compreende“;
“Normalmente, aquelas razões que nós mesmos encontramos convencem-nos mais do que as que procedem dos outros“;
“Se alguém se queixa de trabalhar demais, que seja condenado a não fazer nada“;
“A principal doença do homem é a curiosidade inquieta daquilo que não pode conhecer“;
“Poucas amizades subsistiriam se cada um soubesse aquilo que o amigo diz de si nas suas costas“;
“O que é o homem na natureza? Um nada em relação ao infinito, um tudo em relação ao nada, um ponto a meio entre nada e tudo“;
“O aumento do conhecimento é como uma esfera dilatando-se no espaço: quanto maior a nossa compreensão, maior o nosso contato com o desconhecido“.
Dica: acrescentando a este texto, recomendo um vídeo no YouTube do professor Andrei Venturini Martins, no lançamento do seu livro “Do Reino Nefasto do Amor-Próprio“, onde ele explica a questão da natureza do mal em Pascal, relacionando-o com Santo Agostinho.
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