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Porque A Arte Somos Nós

John Carpenter, realizador independente, é conhecido muitas vezes por beliscar as fragilidades americanas, daí ser conhecido na indústria americana por um cineasta controverso. Carpenter tem uma vasta filmografia, da qual vou destacar seis filmes (“Dark Star”, “Halloween”, “The Fog”, “The Thing”, “Christine” e “They Live”). Entre os cineastas que deram carta de nobreza ao cinema fantástico dos últimos 30 anos, Carpenter ocupa certamente um lugar privilegiado.

Enquanto Tobe Hooper ou George Romero são adulados pelos seus filmes do passado (“Massacre no Texas“, “A Noite dos Mortos-Vivos“), e Wes Craven passou visivelmente a outra coisa depois de ter desmontado os mecanismos do filme de terror na saga “Scream“, John Carpenter conquistou ao longo da sua carreira, do 1.º ao 17.º filme, um estatuto de mito vivo do cinema fantástico, representando hoje uma determinada ideia íntegra de um cinema de terror finalmente levado a sério, e propondo, inclusivamente, um discurso sobre a sociedade americana.

Dark Star

“Dark Star” (“Estrela da Morte”), 1974 – Comédia, Sci-Fi

No ano de 1971, John Carpenter, estudante da Escola de Artes Cinematográficas da Universidade do Sul da Califórnia desde o ano de 1968, realiza a sua primeira média-metragem: “Estrela da Morte”. Carpenter conta com a colaboração de colegas como Dan O’Bannon, futuro argumentista do clássico filme de ficção científica de 1979, “Alien – 8.º Passageiro“. “Consegui recolher financiamento, e investi uma parte importante do meu dinheiro pessoal…” – John Carpenter

“Estrela da Morte”, um filme que na montagem inicial era de quarenta e cinco minutos, quatro anos mais tarde tornou-se num filme de hora e meia. John Carpenter e Dan O’Bannon trabalharam a parte central do filme, e acrescentaram mais cenas que não estavam presentes durante a primeira versão.

A obra estreou nos cinemas americanos no ano de 1974. O segundo ato acrescentado ao filme incluía um retrato da vida dos astronautas na nave, e a famosa cena em que o Sargento Pinback, protagonizado pelo próprio Dan O’Bannon, combate com um extraterrestre num elevador. “Diria que se trata em primeiro lugar de uma comédia de ficção científica…” – John Carpenter

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Halloween

“Halloween” (“Regresso do Mal”), 1978 – Horror, Thriller

No ano de 1978, John Carpenter realiza um filme de terror intitulado de “Regresso do Mal”, do qual o cineasta desenvolveu uma nova dimensão sobrenatural, fazendo de Michael Myers uma encarnação dos seus piores pesadelos. “Na sua base, “Halloween” contém vários elementos freudianos.” – John Carpenter

O filme relembra momentos passados na companhia de filmes surrealistas de F. W. Murnau ou Carl Theodor Dreyer, por exemplo, que integram os seus sonhos diretamente nos seus filmes. John Carpenter também compôs a música para o filme, num ritmo repetitivo e minimalista que expressa as emoções mais aterradoras das imagens. “…era um filme assustador que dizia algo a todos os que o foram ver, especialmente por se desenrolar numa pequena ordinária cidade, um subúrbio perfeitamente banal.” – John Carpenter

“Regresso do Mal” é um filme que se baseia sobretudo em “Psycho“, de Alfred Hitchcock, que serviu como ponto de partida ao cineasta norte-americano. A obra de Carpenter serviu de rampa de lançamento para muitas obras que apareceram depois, como por exemplo, a saga “Sexta-Feira 13“, “Pesadelo em Elm Street“, “Scream”, e muitos outros.

Este foi filmado, em grande parte, durante a noite, o que permitiu a John Carpenter trabalhar melhor com os elementos de suspense, como por exemplo, na sequência de abertura vemos o ponto de vista de Michael Myers quando este mata a irmã, depois de a ter visto a ter relações sexuais com o namorado. Uma cena que instaura tensão e suspense ao espectador.

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The Fog

“The Fog” (“O Nevoeiro”), 1980 – Horror, Thriller

No ano de 1979, John Carpenter realiza “O Nevoeiro”, um filme muito próximo de “Regresso do Mal”, uma vez que ambas as películas tratam de medos que provêm sobretudo da infância. “O Nevoeiro” é um filme que debate sobre a superstição e as crenças do nosso passado ancestral. Este conta com a participação de celebres atrizes norte-americanas como Jamie Lee Curtis e a sua mãe, Janet Leigh, que também participa no filme “Psycho” de Alfred Hitchcock, no papel de Marion Crane.

Para alguns, o cemitério é apenas um lugar onde há corpos enterrados, para outros o cemitério pode ter um significado simbólico, não apenas por ser um lugar de enterro, mas também porque é um lugar que preserva uma parte da história humana. “O enterro significa a separação definitiva entre vivos e mortos, e lembra-nos que, seja qual for a nossa condição, o nosso destino será idêntico e conducente ao mesmo ponto.” – John Carpenter

Nos Estados Unidos da América, há tempo atrás, existiam poucos americanos fora dos centros do Protestantismo, que consideravam o diabo como uma força nefasta. Hoje milhares de cidadãos comuns da classe média praticam o satanismo e a adoração do diabo. De repente, este “culto” é algo mais do que uma moda, mais do que uma curiosidade que parte de um interesse no ocultismo. Essa fé assustadora, cega pelo poder satânico, por vezes levou à congregação e a atos sexuais macabros e violentos.

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The Thing

“The Thing” (“Veio do Outro Mundo”), 1982 – Horror, Mistério, Sci-Fi

No ano de 1982, época em que “Veio do Outro Mundo” foi realizado, o cinema de terror usava um dos mais velhos clichés na história da sétima arte, que consiste em defender que é preciso deixar as criaturas escondidas no escuro para criar mais suspense. No entanto, Carpenter opôs-se a esse princípio. “Quando se quer sugerir que um extraterrestre é absolutamente real e que não se trata simplesmente de um tipo enfiado dentro dum disfarce, deve-se forçosamente fazê-lo sair para a luz do dia.” – John Carpenter

“Veio do Outro Mundo” é como uma metáfora para as doenças que na época foram descobertas pela primeira vez nos Estados Unidos da América, e eram bastante prenunciadoras de morte, como por exemplo, cancro ou HIV/SIDA. Durante todo o filme existem muitas cenas em que vemos autópsias a ser feitas a corpos inanimados, reanimações ou colheitas de sangue. Uma característica única, que associada aos elementos de desconfiança entre a equipa, e cedo se darem conta da presença do perigo, coloca esta obra entre os melhores filmes do género de terror.

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Christine

“Christine” (“Christine: O Carro Assassino”), 1983 – Horror, Thriller

No ano de 1983, John Carpenter realiza o filme de terror “Christine: O Carro Assassino”, uma adaptação do romance do escritor Stephen King. O trabalho conta com uma seleção de temas musicais que passam pelos anos 50, 60, 70, e 80, com nomes sonantes como os de George Thorogood & The Destroyers, Little Richard, Buddy Holly, entre outros. Uma das características na forma de escrita de Stephen King é a sua forma de conseguir misturar o elemento do fantástico, com a banalidade da vida. “As histórias de King desenrolam-se essencialmente na cabeça das personagens” – John Carpenter

“Christine: O Carro Assassino” é sobre a história de um Plymouth Fury de 1958, pintado a cor vermelha, possuído pelo espírito de um serial killer que vagueia as ruas de um pequeno subúrbio nos Estados Unidos, em busca de vingança. Aqui, o automóvel é a cultura dominante e, claro, proporciona aos Estados Unidos grande parte dos seus mortos. Além disso, diariamente centenas de pessoas morrem nas autoestradas e milhares são feridas gravemente. Nesse aspecto, mais do que uma história de terror, “Christine: O Carro Assassino” é sobre a fantasia do norte-americano pelo automóvel.

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They Live

“They Live” (“Eles Vivem”), 1988 – Acção, Horror, Sci-Fi

“Eles Vivem” é um filme profundamente politico, realizado por John Carpenter no ano de 1988, foi um fracasso de bilheteira na sua data de estreia, e recebeu comentários negativos dos seus críticos. Este é hoje é considerado um filme de culto e trata-se de uma resposta direta ao cinema americano, à televisão e à apatia do público americano em geral que se conforma a consumir simples fórmulas pré-fabricadas, desvalorizando a originalidade de pensamento.

Neste sentido, os extraterrestres de “Eles Vivem” representam uma sociedade mais conservadora e um modelo de capitalismo americano que, ao fim e ao cabo, nega o individuo. “…mas penso que é a televisão que desempenha o papel principal na estandardização dos filmes… um filme não deve ultrapassar uma certa duração, não chocar um público demasiado jovem… e todos estes constrangimentos fazem com que os filmes, naturalmente, se pareçam todos uns com os outros.” – John Carpenter

Nada, personagem interpretada pelo falecido ator Roddy Piper (1954-2015), representa um indivíduo de classe baixa, em constante deslocação à procura de um trabalho. No filme, do ponto de vista da sociedade, os pobres são invisíveis, não são nada. “Penso que nos Estados Unidos temos uma atitude muito ambígua face à pobreza. Há muita hostilidade e agressividade para com os sem-abrigo.” – John Carpenter

Neste ponto, concordo com John Carpenter, pois os sem-abrigo representam as fragilidades de um sistema capitalista.

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Miguel Mendes

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