OBarrete

Porque A Arte Somos Nós

Em 1982, após o seu lançamento, o filme “The Thing” teve uma recepção tão negativa com a maioria dos críticos a categorizarem-no de “lixo instantâneo” e de fiasco, sendo que até os fãs de ficção científica odiaram. Embora o filme tenha sido indicado para alguns prémios Saturn, também foi indicado nos Razzie Awards para pior banda sonora (hã!?).

Como consequência do desempenho tão decepcionante, John Carpenter perdeu a confiança em algumas oportunidades de realizar outros filmes de terror. Também conhecido como “o filme mais odiado de todos os tempos”, “The Thing” tornou-se uma das melhores obras de terror e ficção científica, e hoje é definitivamente um clássico de culto, elogiado pelos seus momentos arrepiantes, efeitos visuais e criativos, tom niilista e, como é claro, pela sua música.

The Thing” é um dos poucos filmes de Carpenter cuja banda sonora não é composta pelo próprio. Então, deixou as honras para o maestro Ennio Morricone, querendo uma abordagem musical europeia. A sua decisão provou ser uma jogada sábia, pois o que Morricone compôs é inegavelmente uma obra única na história da composição de terror. No entanto, o músico produziu aproximadamente uma hora de material que permaneceu praticamente sem uso. A razão para tal foi que Carpenter sentiu que algumas peças não se encaixavam nas cenas de tensão, e como resultado, o realizador acabou por gravar alguns efeitos sonoros para essas cenas.

Quanto à música, Morricone escreveu tanto para orquestra, como para sintetizador, e nalguns casos para ambos. Muito distante da sonoridade habitual do compositor italiano, a música em “The Thing” é muito intensa e assustadora. Além disso, quase não há melodia, a ênfase está na criação de uma atmosfera emocionante, elevando as qualidades do terror psicológico.

Na parte orquestral, começa com Humanity (Part 1), uma peça lenta de sete minutos que apresenta o tema principal do filme e estabelece o ambiente sombrio para o resto do disco. Não apenas se centra numa atmosfera sombria, mas também cria um sentimento de confusão com Contamination, que se assemelha à estética da música moderna, e cria um senso de intensidade emocional com Bestiality, claramente influenciado por Bernard Herrmann.

Na parte para sintetizador, Morricone mistura uma abordagem minimalista com um som de órgão barroco. Quando o lado A está prestes a terminar, há a primeira faixa electrónica Eternity, que começa com uma única nota que determina o ritmo e alguns ruídos electrónicos, depois crescendo num mar de órgãos, criando uma estética um tanto surreal.

Sexta banda sonora mais assustadora, segundo a Rolling Stone

No lado B, há Sterilization, que possui uma progressão sombria de acordes de órgão, juntamente com um trabalho de sintetizador exclusivo que continua a adicionar camadas após camadas de melodias minimalistas. Depois, há Humanity (Part 2), um reprise versão electrónica, mas o compositor italiano não deixa o seu órgão de fora: uma visão ainda mais sombria da primeira faixa. Dito isto, a utilização de sintetizadores e de alguns elementos que lembram Iannis Xenakis ou Karlheinz Stockhausen, tornam toda a sonoridade muito interessante e cativante.

Em suma, a trilha de “The Thing” não é apenas uma boa combinação com os efeitos especiais alienígenas, mas o mais importante é que habilmente coloca o significado mais profundo do filme na música. Ouvir música sozinha sem as imagens pode ser uma coisa diferente, especialmente para aqueles que acreditam que esta funciona melhor em conjunto com a componente visual, mas não desta vez. O maestro Ennio Morricone intensificou o seu jogo e acabou por criar uma banda sonora minimalista, com suspense, para um dos melhores filmes de John Carpenter. Além disso, não perde a sua eficácia, pois captura perfeitamente o desespero presente na obra. Um dos melhores trabalhos do maestro, com certeza.

João Filipe

Rating: 3.5 out of 4.

One thought on ““The Thing” Soundtrack, Ennio Morricone: Inaudita faceta do Maestro

Leave a Reply

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

%d bloggers like this: