viva o rock brasileiro #24
1987 vê surgir o 2.º disco da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii, com canções sólidas e consistentes. Fora os hits que emplacaram nas rádios e ecoados pelo público que só fazia crescer, consolidou nos fãs os lados B e no todo o disco é uma pérola. A setlist apresenta:
A Revolta Dos Dândis I
Terra De Gigantes
Infinita Highway
Refrão De Bolero
Filmes De Guerra, Canções De Amor
A Revolta Dos Dândis II
Além Dos Out-Doors
Vozes
Quem Tem Pressa Não Se Interessa
Desde Aquele Dia
Guardas Da Fronteira
Literária e filosoficamente, as menções a Albert Camus (1913-1960) na faixa-título em dois momentos e a Jean-Paul Sartre (1905-1980) na menção da letra de Guardas Da Fronteira. Algumas letras se assemelham a crónicas e há de tudo um pouco: ironia à indústria que nos tenta vender mercadorias, como no enunciado de Guardas Da Fronteira; confissão em Vozes de um letrista que diz não suportar a luz do sol (o que levou adeptos de teorias conspiratórias a aventarem se Humberto Gessinger era vampiro. Ou seja, a idiotia não perdoa ninguém).
Desde Aquele Dia é de uma levada super prazerosa e dançante, e Refrão De Bolero alude a vinho barato, cara embriagada no espelho da casa-de-banho e uma chamada Ana. O refrão cola nos ouvidos como chicletes:
“Ana, teus lábios são labirintos, Ana
Que atraem os meus instintos mais sacanas
Teu olhar sempre distante sempre me engana…“
Um detalhe marcou-me nos tempos de faculdade. Como morava numa cidade distante da universidade, viajava todo dia e para matar o tempo tocávamos violão às sextas-feiras e eu era um deles (mais arranhava que tocava). A nossa turma era mais adepta a hits. Então, as canções dos Engenheiros que eu ousava cantar eram as mais conhecidas. Certa feita, pegando boleia num autocarro de estudantes de uma cidade vizinha, havia também uma turma do violão e o sujeito passou a tocar e cantar o disco “A Revolta Dos Dândis” na íntegra. Amei cantar os clássicos do lado B.
Trinta anos depois, em 2017, Humberto, agora em carreira solo, fez o registo do álbum ao vivo e o resultado foi simplesmente espetacular. Tive a sorte de ir a este concerto e cantei cada sílaba. Engraçado que não me canso de o ouvir. É muito bom. Embora pudesse citar aqui várias letras, irei ater-me ao clássico que diz muito sobre a própria história dos Engenheiros do Hawaii, pela longevidade e integridade, uma verdadeira Infinita Highway de lirismo e melodia. Despeço-me aqui convidando todos a mergulharem nesta história.





“Você me faz correr demais
Os riscos desta highway
Você me faz correr atrás
Do horizonte desta highway
Ninguém por perto, silêncio no deserto
Deserta highway
Estamos sós e nenhum de nós
Sabe exatamente onde vai parar
Mas não precisamos saber pra onde vamos
Nós só precisamos ir
Não queremos ter o que não temos
Nós só queremos viver
Sem motivos, nem objetivos
Estamos vivos e isto é tudo
É sobretudo a lei
Dessa infinita highway
Quando eu vivia e morria na cidade
Eu não tinha nada, nada a temer
Mas eu tinha medo, medo dessa estrada
Olhe só! Veja você
Quando eu vivia e morria na cidade
Eu tinha de tudo, tudo ao meu redor
Mas tudo que eu sentia era que algo me faltava
E à noite, eu acordava banhado em suor
Não queremos lembrar o que esquecemos
Nós só queremos viver
Não queremos aprender o que sabemos
Não queremos nem saber
Sem motivos, nem objetivos
Estamos vivos e é só
Só obedecemos a lei
Da infinita highway
(Highway)
Oh highway
Escute garota, o vento canta uma canção
Dessas que a gente nunca canta sem razão
Me diga, garota, será a estrada uma prisão?
Eu acho que sim, você finge que não
Mas nem por isso ficaremos parados
Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão
Tudo bem, garota, não adianta mesmo ser livre
Se tanta gente vive sem ter como viver
Estamos sós e nenhum de nós
Sabe onde quer chegar
Estamos vivos sem motivos
Que motivos temos pra estar?
Atrás de palavras escondidas
Nas entrelinhas do horizonte dessa highway
Silenciosa highway
(Highway)
Eu vejo um horizonte trêmulo
Eu tenho os olhos húmidos
Eu posso estar completamente enganado
Eu posso estar correndo pro lado errado
Mas a dúvida é o preço da pureza
E é inútil ter certeza
Eu vejo as placas dizendo
Não corra, não morra, não fume
Eu vejo as placas cortando o horizonte
Elas parecem facas de dois gumes
Minha vida é tão confusa quanto a América Central
Por isso não me acuse de ser irracional
Escute garota, façamos um trato
Você desliga o telefone se eu ficar muito abstrato
Eu posso ser um Beatle, um beatnik
Ou um bitolado
Mas eu não sou ator
Eu não tô à toa do teu lado
Por isso, garota, façamos um pacto
De não usar a highway pra causar impacto
Cento e dez
Cento e vinte
Cento e sessenta
Só pra ver até quando
O motor aguenta
Na boca, em vez de um beijo
Um chiclet de menta
E a sombra do sorriso que eu deixei
Numa das curvas da highway
Highway
Infinita highway
Highway
Infinita highway
Oh oh highway
Highway
Oh oh highway“

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