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“Madres Paralelas” (2021) – “Mães Paralelas“, em português – conta a história de duas mulheres, Janis (Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), que dão à luz no mesmo dia e acabam por desenvolver uma amizade improvável. O filme é escrito e realizado por Pedro Almodóvar.

O filme tem uma vertente contemplativa e humana bastante forte, conseguindo extrair aquela que é a responsabilidade de ter um filho, sobretudo quando nem sempre acontece ser desejado ou planeado. Nesse sentido, Pedro Almodóvar já nos tem vindo a habituar a narrativas que espelham muito bem essa dor, sofrimento e humanidade nas mulheres. Estamos perante uma narrativa, estruturalmente falando, muito coesa. Algo que já é recorrente em Almodóvar; no entanto, “Madres Paralelas” consegue estar a um nível mais elevado em matéria de estrutura narrativa. Ou seja, a história tem uma grande envolvência, que vai sendo justificada de forma certeira e madura, como um todo.

Neste sentido, nesta amizade improvável que se desenrola entre as duas protagonistas, a história assume-se como simplesmente brilhante, uma vez que consegue extrair significados muito próprios da essência humana, além de o fazer de forma extremamente fluída. Nomeadamente, num filme que facilmente poderia cair em território mais convencional, este acaba sempre por se conseguir reinventar, mesmo tendo uma essência e uma mensagem muito forte a transmitir. Com isto, Pedro Almodóvar consegue construir um filme deveras digno, a fim de extrair significados muito fortes daquilo que somos.

Ana (Milena Smit) e Janis (Penélope Cruz)

Uma palavra de enaltecimento para as interpretações, que estão verdadeiramente sublimes, assim como o argumento per si – argumento, esse, que não se compreende como não está nomeado para Melhor Argumento Original nos Óscares 2022. De facto, a forma como a história consegue pegar num tema tão sensível como este e o conseguir tornar tão completo, através das suas interpretações, é algo que só é possível quando a estrutura do filme, a par e passo com a qualidade do seu argumento, assim o permite.

Além disso, é uma obra bastante forte e crua na maneira como transmite as suas mensagens, sem dar palmadinhas nas costas, o que é algo muito característico em Almodóvar, que passa por mostrar as coisas tal e qual como elas são. Isso permite que as suas narrativas, histórias e filmes sejam, acima de tudo, profundamente realistas, únicas e emocionalmente intensas.

Penélope Cruz faz uma interpretação verdadeiramente memorável, interpretação essa que lhe valeu a nomeação para Melhor Atriz Principal nos Óscares. E, de facto, as duas atrizes em questão têm bastante química uma com a outra, tornando “Madres Paralelas” muito mais próximo do espectador. Por outro lado, em matéria de críticas, estamos perante uma obra com um final pouco audaz, e isso só acontece, porventura, porque a história até então estava num nível tremendamente alto. No entanto, penso que não seja um final que se adeque perfeitamente à globalidade da obra. À parte disso, estamos perante uma longa-metragem que não apresenta grandes falhas em termos de plot, nem de estrutura/forma.

“Madres Paralelas” (2021)

Assim, “Madres Paralelas” constitui o mais elevado paralelismo daquilo que é um bom cinema: um cinema que traz algo de novo para contar e que, através de Pedro Almodóvar, consegue ser elevado de uma forma muito pura, muito orgânica – e, acima de tudo, humana. Deste ponto de vista, a geometria deste filme é verdadeiramente arrebatadora e levanta sérias questões sobre a humanidade, sobre a forma como muitas vezes os nossos sentimentos e a nossa cegueira emocional nos levam a cometer completos suicídios mentais, em matéria da forma como nos relacionamos com as pessoas e de como as tratamos.

Mas também – e de um ponto de vista mais otimista –, permite que reflitamos sobre a necessidade de abraçarmos a nossa própria humanidade, de forma a que consigamos crescer, sermos mais felizes e, acima de tudo, contribuirmos para um mundo melhor. Mundo (cinematográfico), esse, no qual Pedro Almodóvar tem um lugar de destaque.

Por um cinema feliz.

Tiago Ferreira

Rating: 3 out of 4.

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One thought on ““Madres Paralelas”: Uma geometria arrebatadora

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