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“Candyman” (1992) conta a história de Helen (Virginia Mardsen), uma estudante dedicada a entender as chamadas “lendas urbanas modernas”, que está a construir uma pesquisa científica para perceber como é que o imaginário social contribui para estimular, precisamente, essas lendas. No desenvolvimento da sua tese, ela começa a ganhar interesse sobre um mito em particular, o de Candyman, uma figura assustadora, alegadamente responsável por uma série de assassinatos no bairro de Cabrini-Green, Chicago.

Desta forma, e determinada em desvendar os segredos por detrás deste “ser criminoso”, resolve visitar a região em concreto para recolher alguns dados empíricos. No entanto, à medida que Helen se começa a aproximar de uma verdade sobre este tema, acontecimentos estranhos começam a ocorrer, afetando a sua vida e ameaçando aqueles que tem em seu redor. O argumento deste filme é baseado no conto do escritor Clive Barker, “The Forbidden“, escrito por Bernard Rose, o também realizador desta obra cinematográfica.

“Candyman” – em português “O Assassino em Série” – é um filme com uma dinâmica muito própria, conseguindo fazer assentar um argumento sui generis numa estrutura narrativa muito segura de si. Muito segura de si, no sentido em que todos os passos que dá, eventualmente, são o resultado de um projeto com mística, uma marca identitária que “Candyman” consegue construir. Mas tudo isto funciona também, naturalmente, devido à profundidade das personagens como um todo ­– ou, pelo menos, pela sua preponderância certeira em momentos-chave da história.

Helen (Virginia Mardsen)

O que se vive em “Candyman” é uma enorme crítica social à opressão e, também, a transposição da beleza do coletivo, quando existe um sentimento profundo entranhado em nós por fazer honrar muitos que em vida foram, simplesmente, desprezados. E todo esse desprezo envolve uma comunidade que se alimenta de uma lenda para afugentar e amedrontar todos aqueles que não respeitam o passado das classes marginalizadas e sujeitas a condições de vida precárias.

Helen embarca numa realidade bem diferente da sua, e esse confronto é deveras interessante, pois nesse momento ela tem a oportunidade de lidar com alguns preconceitos e julgamentos, que obriga a reformulá-los. Neste momento da narrativa, temos um enquadramento muito interessante do ponto de vista da fotografia e da direção de arte, capazes de dar vida a um bairro pouco acolhedor. Além disso, a forma como se dá vida à personagem de Candyman, um ex-escravo de uma época colonial, assassinado por se ter envolvido com uma mulher branca, que, no fundo, vê a sua imagem como aspirante a artista ser reduzida e deturpada a um ser maquiavélico.

Neste sentido, a perpetuação dos seus atos acontece como uma representação de profundos preconceitos raciais, que influenciam Helen nas suas avaliações. Além disso, a dada altura esta começa a ser de tal forma influenciada pelo confronto entre realidade e ficção, que se perde no meio dos seus medos, receios e dúvidas e, a dado momento, incompreendida e rebaixada por muitos, é levada a questionar a sua própria natureza. Um dos fatores mais interessantes do filme tem, precisamente, a ver com a forma como consegue incorporar uma história que facilmente poderia cair à medida que a sua complexidade fosse revelada, mas a verdade é que consegue aguentar-se do início ao fim, com uma visualização profunda.

“Candyman” (1992)

No entanto, também é pertinente afirmar que, em finais de segundo ato, o filme entra ligeiramente em território genérico, sem se conseguir reinventar verdadeiramente, o que acaba por retirar alguma força à mestria da obra como um todo, sem nunca estragar todo o trabalho feito até então. Outro aspeto que o filme poderá estar em défice tem que ver com as suas variações narrativas, que na verdade são demasiado seguras para um filme de suspense. Por outro lado, há um enorme jogo de cintura por parte de “Candyman” em retratar não só a vulnerabilidade da protagonista perante o nosso “vilão”, mas também uma certa resignação por parte de Helen em aceitar o seu destino.

Assim, “Candyman” afigura-se como um filme refrescante q.b., sobretudo pelo tema que traz e pela forma como aborda um ambiente bastante místico, mas sem nunca conseguir verdadeiramente dar aquele salto para ser considerado, do início ao fim, um filme inesquecível. No entanto, tem na sua crítica social e na arte da sua direção uma história de terror que nos ensina a aceitar a nossa verdade e o nosso destino.

Tiago Ferreira

Rating: 2.5 out of 4.

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