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Porque A Arte Somos Nós

Antes de chegar a “My Octopus Teacher”, admito ter alguma dificuldade em lidar com a forma como a Netflix pressiona o consumidor de modo a que ele avance logo para outro produto fílmico quando se termina de ver seja o que for. A contagem decrescente é especialmente irritante quando a experiência foi de tal modo enriquecedora que leva a querer ver os créditos finais em forma de meditação. Foi exatamente esse sentimento enfurecedor que a plataforma de streaming desencadeou em mim quando acabei de passar por “My Octopus Teacher”, um documentário memorável que revela uma poderosa conexão entre um humano e um animal.

O ser vivo em causa é um polvo que habita na floresta subaquática sul-africana, local onde Craig Foster, um cineasta, refugiasse daquilo que pode ser descrito como uma crise existencial. Exausto do stress quotidiano, desligado da sua família e sem grande motivação para filmar, Craig retoma às suas raízes e enfrenta diariamente as águas geladas por desporto e procura de paz de espírito. Até que certo dia deparasse com um evento fortuito que o move a seguir a criatura marinha até ao seu esconderijo. Depois de se lembrar de o visitar todos os dias, o cineasta e o polvo começam a estabelecer uma amizade improvável.

Craig Foster e o seu novo amigo

É bem possível argumentar que “My Octopus Teacher” é um daqueles documentários para pessoas que julgam não ter tanto interesse nos mesmos. Isto porque além de ter uma faceta que está motivada em registar o ambiente místico das profundezas do oceano, procura também envolver numa narrativa emocional com princípio, meio e fim. Uma história que além de todo um esplendor visual aborda também mensagens pró-natureza e demonstra de uma forma mais íntima aquilo que em parte o documentário “David Attenborough: A Life on Our Planet (2020) procura esclarecer à escala planetária. Que é o facto de a vida humana beneficiar de elos coesos com os ecossistemas.

Neste âmbito, o vínculo é de cariz simbiótico. Pois tanto Craig colhe perspetivas e entendimentos das suas vivências com o polvo, como o próprio animal interage com o cineasta de modo afetivo – enrolando um tentáculo no seu dedo, chegando mesmo a abraçá-lo! Esta é precisamente outra das componentes que enriquece o documentário: o quanto aprendemos sobre esta espécie. Desde as formas engenhosas que utiliza para ludibriar as presas como as táticas e estratégias que emprega aquando o momento da caça. É uma jornada que reconta isto e muito mais, ao ponto de criarmos uma empatia tal com o polvo que certos momentos da narrativa comovem o coração mais indiferente.

“My Octopus Teacher”

Estamos perante uma peça fílmica de um brilhantismo tal, que na gentileza do trato animal recorda princípios fundamentais que guiam uma conduta humana honrosa. Ideais como a tolerância, a curiosidade e a compaixão. É verdadeiramente impressionante como é que tudo isto pode ser absorvido através de um vínculo tão inusitado e exótico. Talvez porque quando a Humanidade falha, estamos programados para encontrar respostas na Natureza. Quem sabe?

O que é certo que nem sempre é uma visualização fácil. Tal como numa obra de ficção, “My Octopus Teacher” gera suspense por meio de eventos dramáticos e testemunha o fecho de um ciclo de vida com respeito e tato. No entanto, o foco mantém-se nos poderes terapêuticos e no superar de uma fase importantíssima para a génese deste filme. Sendo que depois de testemunharem esta história de amor, nunca mais vão olhar para o polvo da mesma forma, ou mesmo para vocês próprios.

Bernardo Freire

Rating: 4 out of 4.

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