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Porque A Arte Somos Nós

Quando lemos este título associamos a algo divertido, com piada, ou até mesmo a algo um bocado infantil… Mas não é o caso. Apesar da infância ser algo marcante no mote desta obra, determinante mesmo, a fantasia leva-nos a várias repetições de uma situação em particular, com vários desfechos. Essas repetições levam a que o espectador queira sempre perceber o que de diferente pode acontecer, mas por vezes só queremos que a narrativa evolua para outro tempo e espaço. “Koko-di Koko-da” proporciona-nos momentos de suspense e revolta, pois somos puxados para o centro da acção de uma forma angustiante – não temos poder de decisão sobre os eventos.

O filme resume-se a um casal que procura reencontrar-se, e quando vai acampar, é aterrorizado por um grupo estranho liderado por um mestre de cerimónias. A razão deste acampamento é ainda resultado da perda da filha do casal, que morreu de forma súbita durante o sono, no dia do seu aniversário. De forma a tentarem restabelecer uma ligação, anos após este evento traumático, marido e mulher decidem acampar literalmente “no meio do nada”. O que acontece a meio da noite é surreal, pois tal como nos é apresentado no início do filme, um grupo constituído por dois homens, uma mulher e um cão – passados de conto a realidade – surpreendem o casal na tenda recorrendo a um jogo psicológico que acaba sempre de forma violenta. Após estas cenas, tudo parece ter sido um sonho. O plano dentro da tenda, que se repete ao longo da narrativa, é como um restart de toda a acção, como um jogo que cabe aos protagonistas dar um final diferente, mas com uma particularidade: o marido já sabia que tudo isto ia acontecer de novo. Ficamos sempre expectantes a cada novo começo, de forma a que o casal consiga evitar todo aquele sofrimento; mas de uma maneira ou outra, são sempre “apanhados”.

Este tipo de terror psicológico funciona muito bem graças a Johannes Nyholm, que escreveu e realizou a obra. A certa altura, somos presenteados com um momento que se distancia da corrente principal do filme. Uma peça de teatro com coelhos, um animal com um contexto específico no filme – as máscaras que os pais e a filha tinham no início – que conta uma história de perda, luto, força e ressurreição. Um momento intenso e sentimental, que nos faz esquecer todo o terror passado. Tudo dentro de uma cabana no meio da floresta, como que uma salvação momentânea do destino. As analogias da peça fazem-nos entrar noutra dimensão, como que se fosse algo fora do filme que estamos a assistir. Contudo, a ligação com a história daqueles pais é óbvia, acrescentando uma dose de emoção elevada a todo aquele momento.

No que toca à espinha dorsal do filme, o líder do grupo rebelde – que mais se parece com a personagem “Fitzcarraldo” – é um homem sádico que comanda o grupo, incluindo o cão, em todas as acções que envolvem violência e até alguma violação. A recorrente aparição desta “equipa” funciona como uma espécie de paranóia, procurando instigar no espectador a sensação de perturbação aliada à perda de um ente querido: uma estratégia dura, mas funcional, de passar emoções através do grande ecrã. A meu ver, é uma jogada ganha por parte de Nyholm, que dá mais prioridade à sensibilidade emocional do que propriamente à dimensão fantástica da película. Logo, independentemente destes eventos “irreais” que fazem avançar o filme, são as suas ramificações que realmente preenchem a obra.

O elenco tem uma participação positiva, com foco especial para Leif Edlund – vencedor do Prémio Melhor Ator no Fantasporto 2020. A personagem deste, mais do que a de sua esposa, é crua e transparente, fazendo passar o pânico e a ansiedade para o outro lado do ecrã. Este é um filme consistente e emotivo. O conceito tempo é desafiado constantemente, atingindo o seu pico no fim, quando o casal atropela um cão igual ao que o grupo que causava o terror trazia sempre ao colo. Contudo, tendo em conta a própria fase da narrativa em que tal evento acontece, percebe-se que é dada pouca relevância a esta característica da película. Mais do que os sustos e o horror, este é um filme que transmite um trauma. Algo que fica tatuado na vida e na mente, por vezes ressurgindo de forma maléfica e sem fuga possível.

Rating: 3 out of 4.

IMDB

Rotten Tomatoes

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