“A psicose é um transtorno psicológico em que o estado mental da pessoa se encontra alterado, fazendo com que viva em dois mundos simultaneamente, no mundo real e no seu imaginário, porém não consegue diferenciá-los e muitas vezes eles se fundem.”
Cláudia Faria, psicóloga, no site Tua Saúde
E eis que chegamos à discussão de um dos personagens mais famosos da História da Humanidade: o homem que encarnou Deus na face da Terra, o filho dele, mas cabem algumas questões acerca do homem e do mito. Vamos a elas? Primeiramente, acerca do nome. O mais adequado seria chamá-lo de Jesus de Nazaré. Atribui-se o nome e a cidade de onde ele provinha: Nazaré. Assim como José de Arimateia, etc. Certamente muitos denominam Jesus o Cristo, daí Jesus Cristo, sendo o significado de Cristo Ungido, como se o homem tivesse sido tocado pelo dedo de Deus. “Vamos devagar, pois o andor é de barro”, diz um adágio popular aqui das Minas Gerais.
Jesus nasceu em Belém, Judeia, no ano 6 a. C. Verificando esta data, aprendi o detalhe de que na verdade o nosso calendário cristão não corresponde exatamente ao ano de nascimento do profeta. Muito já se sabe e muito já se disse sobre Jesus, acerca dos seus milagres, da sua personalidade, das suas pregações, do seu calvário e da sua ressurreição, mas é aqui que quero ser impertinente e questionar algumas coisas. Respeitosamente, irei me ater ao homem Jesus (deixemos as questões metafísicas para depois, pois elas não se sustentam). Refletindo acerca da sua figura histórica, da herança que nos proporcionou vários pontos estão constituídos por preconceitos.
Primeiramente, a eugenia do Jesus que foi pintada por europeus como Giotto que, em 1305, representou o Cristo caucasiano na Capela delli Scrovegni, em Pádua, Itália. Dizem que no século XI d. C. os turcos pintaram o personagem mais claro de forma a diferenciá-lo dos palestinos, por diferenças étnicas. E é claro que com o Renascimento italiano Jesus foi personalizado como branco, cabelos encaracolados caindo pelos ombros, estilo rebelde e digamos, popstar, barba e olhos azuis.

De modo discreto, percebo o preconceito da cor quando avento a obviedade de que se Jesus é judeu, certamente possuía uma pele amorenada, era atarracado fisicamente e tinha cabelos crespos. Acerca da aparência física, vá lá, se explicarmos direitinho o interlocutor mais dogmático pode entender. Mas neste tema é sempre preciso muito tato, um autêntico pisar de ovos.
Um outro preconceito que percebo é quando avento a possibilidade de Jesus se ter casado e ter tido filhos. Que mal há em um homem atender aos anseios da sua sexualidade, ainda para mais numa região patriarcal onde desde cedo os destinos das crianças eram traçados para constituírem família? Detalhe este, se Jesus casou ou não. Se não, à época poderia ser observado como homossexual e aqui, por gentileza, não entendam que estou a ofender. A opção sexual de cada um é um problema particular dele e não cabe a mim discriminar.
Analisem que interessante: reconheço em Jesus um grande filósofo e que bom seria se o portador deste grande legado fosse descrito como o é de facto: atarracado mais para negro, num moreno forte e gay. A causa LGBT+ teria motivos para se orgulhar ainda mais. Mas tenho em mente a ideia de que Jesus casou e teve filhos, que era festeiro e um sujeito bastante diferente para os padrões da época. Mas são tudo especulações.
Agora atacarei o tema central expresso no título deste texto. Tenho dificuldades racionais para atribuir a Jesus o título de Cristo. Prefiro ater-me ao homem. À primeira dúvida crucial se de facto Jesus existiu é um ponto pacífico. Céticos podem apontar que ele nada escreveu, que só sabemos da sua pessoa pelo que foi escrito dele (seria ele um personagem?), mas indico que a figura maior da filosofia, Sócrates (470 a. C. – 399 a. C.) também nada escreveu e a sua mensagem foi-nos propagada principalmente pelo discípulo Platão (428 a. C. – 347 a. C.). E é importante explicar o óbvio: a adaptação da filosofia grega na nascente doutrina cristã é vista com grande mérito.
Mas voltemos a Jesus. Um indivíduo que afirma ser filho de Deus, o Enviado que o povo judeu aguardava há muito e muito diferente daquele Deus do Velho Testamento, ou primeiro testamento, uma vez que o termo Velho e Novo ocorrem a posteriori, sendo o Novo inclusive com o personagem supracitado. Este homem diferente, filho de carpinteiro e meio pregador, cheio de metáforas e jogos de palavras, diz-se o filho de Deus e, se até aquele momento foi visto com indiferença pelos romanos que dominavam o Médio Oriente, apenas dirigia uma turba de discípulos e outros curiosos.

Analisando a figura do homem Jesus (aqui sou redundante pois para mim o mundo todo ainda não conseguiu suplantar os limites da existência), sinto que se o ouvisse atentamente num dos seus sermões, ao vivo, e se tivesse a oportunidade de ter dois dedos de prosa com ele em particular, sugeriria: “Menos, Jesus! A sua mensagem é bonita, mas pode dar a impressão de pedantismo e, se me permite a impertinência, megalomania”. Não desconfio do que ele responderia. Neste ponto sou igual a Tomé, precisaria de ver para crer. Dizem que Tomé foi convencido, mas como veio da boca de terceiros, prefiro não acreditar.
Óbvio que não me posso furtar ao aspeto lógico do anacronismo, mas é interessante estudarmos as tipologias psicológicas aventadas no recente século XIX acerca do comportamento humano. Lembro-me que certa vez, durante uma entrevista, respondi com uma metáfora quanto ao meu método para compor personagens para os meus livros. Disse mais ou menos o seguinte: “Como romancista, ouço as vozes dos meus personagens e convivo com eles durante o processo de criação, daí ser um pouco esquizofrénico esse ofício“. Um leitor próximo perguntou-me se eu sofria de esquizofrenia e eu deixei a pergunta no vácuo. Mas é chegada a hora de desmistificar o termo e descrever exatamente o que significa. Eis:
“Esquizofrenia é uma doença psiquiátrica caracterizada por alterações no funcionamento da mente que provoca distúrbios do pensamento e das emoções, mudanças no comportamento, além de perda de noção da realidade e do juízo crítico.“
Cláudia Faria, psicóloga, no site Tua Saúde
Analisando friamente, suspeito que Jesus tinha uma forma leve talvez (vá lá) de esquizofrenia. Ouvir vozes e chamamentos de Deus, perder o senso de realidade em certos momentos e morrer da forma como morreu, é sintomático disso. Mas insisto: se refletirmos melhor, reparamos na outra forma de preconceito a que pessoas acometidas por doenças mentais são vítimas. Quando experimentei esta tese com uma pessoa próxima, ela respondeu-me quase com raiva, como se eu estivesse a ser desrespeitoso e estivesse a ofender Jesus. Nada disso. Não afirmei que ele era assassino, estuprador, ladrão. Ponderei apenas se por ventura ele não sofria de um distúrbio mental.
E afirmei o óbvio: respeito Jesus (de Nazaré e não Cristo) pela sua mensagem e quer queiramos ou não, não me canso de anunciar o óbvio: o lado Ocidental da Civilização é cristã e, mesmo que nos denominemos ateus, somos regidos por calendário cristão, costumes cristãos, leis romanas com fundo cristão e por aí a coisa vai.
Percebe-se que o dogmatismo e o culto exacerbado pelos mitos jogam contra, a figura do homem é importante para mirarmos os seus belos exemplos, mas sem discriminar aspetos deste mesmo homem. Se o que fica são as mensagens, e dizer que a de Jesus é belíssima, atribuir-lhe características que não são dele só o afastam mais de uma melhor compreensão.
Termino afirmando que um Jesus mais humano (deixemos a metafísica para os divagadores) só contribuiria com os seus acertos e erros, o exemplo da superação de modo a suportar todo o peso de uma existência certamente acometida por desequilíbrio mental, por menor grau que fosse, enfim, a discussão dá pano para mangas e eu aqui não me arvoro a dar cabo dela. Com a palavra, os leitores…
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