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“Crash Bandicoot 4: It’s About Time”, lançado em 2020, posicionou-se em termos cronológicos como o quarto jogo da série principal de “Crash Bandicoot“, apesar de até então já terem sido lançados sete jogos principais e mais de uma dezena de jogos “secundários”. “Crash Bandicoot 4”, em termos de continuidade, acaba por ignorar a nível narrativo tudo aquilo que aconteceu após os três primeiros jogos da saga (já analisados n’OBarrete). A este tipo de artifícios que alteram o cânone narrativo de uma obra tem sido usada frequentemente a designação de continuidade retroativa (ou retcon), um subterfúgio que pode parecer uma tendência moderna, mas que já é usado há décadas, sobretudo em livros de banda desenhada.

Em termos de história, inclui tudo aquilo que é esperado das aventuras de Crash e da sua irmã Coco, ou seja, a tentativa de travar o Doutor Neo Cortex e restantes vilões de conquistarem o mundo. Em “Crash 4” é adicionada uma vertente de multiverso (muito em voga por estes dias), em que Crash e Coco necessitam de recuperar quatro máscaras quânticas capazes de fechar as fendas interdimensionais abertas por Neo Cortex e devolver a normalidade aos vários universos.

Em “Crash Bandicoot 4”, Crash e Coco têm que fechar os rifts interdimensionais abertos pelo Doutor Neo Cortex

Nenhum jogo de “Crash Bandicoot” é particularmente reconhecido pelo seu âmbito narrativo, que acaba por ter como utilidade adicionar carga dramática aos vilões, inevitavelmente derrotados por Crash nas boss fights finais de cada capítulo. Estes jogos são sim reconhecidos como marcos dos jogos de plataformas 3D, sendo “Crash Bandicoot 4” uma melhoria clara em praticamente todos os aspetos de jogabilidade. Continuando com a tradição de apresentar níveis com bastante variedade, o jogo não desilude, não desperdiçando o contexto de multiverso para apresentar capítulos diferenciados, mas sempre com a energia característica dos jogos da série.

Além disso, sem contar com uma já esperada enorme melhoria gráfica (aperfeiçoada ainda mais nas versões da PS5 e Xbox Series X|S), “Crash 4” corrige praticamente todas as falhas da primeira trilogia. Em primeiro lugar, a movimentação de Crash ou Coco é muito mais precisa que nos jogos originais, permitindo ao jogador saber o que esperar em cada corrida ou ataque. Em segundo lugar, as trocas de perspetiva entre ou durante níveis deixam de ser tão problemáticas dada a adição de um indicador mais notório na sombra de Crash, que permite realizar saltos de forma muito mais precisa, sem ter que estar constantemente a recalcular timings de salto sempre que a câmara muda de ângulo.

Contudo, talvez a principal mudança feita em “Crash 4” relativamente aos primeiros jogos da saga (e que propositadamente foi deixada para a discussão final) tem que ver com a quebra do sistema de vidas, característico não só da série, mas também de inúmeros outros jogos de plataformas, sobretudo da geração dos jogos de arcade.

Uma das grandes diferenças entre “Crash Bandicoot 4” e os predecessores é a opção de remover o sistema de vidas

Enquanto que nos primeiros jogos o jogador tinha um número limitado de vidas, que, caso acabassem, este era obrigado a recomeçar o nível do início, em “Crash 4” o jogador pode escolher entre este mesmo sistema (denominado “retro”) ou usar a opção “moderno”, que é recomendado pelo jogo e que elimina completamente a necessidade de ter que controlar o número de vidas. Usando o sistema moderno, o jogador continua sempre desde o último checkpoint, independentemente do número de vidas que gastou. Torna-se difícil um juízo objetivo e final em relação à pertinência desta decisão, que irá depender muito das preferências pessoais do jogador.

Por um lado, o uso de um sistema de vidas eleva o desafio, e torna as decisões mais ponderadas, ao invés de meras formas de tentativa e erro. Além disso, o facto de as vidas serem limitadas coloca maiores recompensas na obtenção de colecionáveis que adicionam vidas (como o cogumelo verde de “Super Mario” ou, no caso de “Crash”, as frutas wumpa). Por outro lado, o facto de usar vidas limitadas coloca maior frustração no jogo, obrigando os jogadores a repetir níveis que já tenham concluído (ou, no caso de outros jogos, capítulos inteiros).

Já a remoção de um sistema de vidas, permite aos desenvolvedores concentrarem-se no design dos níveis sem se preocuparem com a influência de o jogador ter poucas ou muitas vidas, permitindo-lhes até elevar a dificuldade (já que o jogador os pode repetir as vezes que precisar).

“Crash Bandicoot 4: It’s About Time”

No caso de “Crash 4”, embora os já mencionados benefícios que a remoção de vidas têm no jogo, não deixa de ficar a sensação de que vários elementos intimamente ligados ao design não foram completamente adaptados a esta nova filosofia. Nos primeiros jogos uma das maiores motivações para quebrar o máximo possível de caixas, apanhar todas as frutas e jogar os níveis extra, prendia-se com o aumento do número de vidas, que iam permitir ao jogador ter mais tentativas até voltar a recomeçar o nível.

Já em “Crash 4” estes elementos colecionáveis mantêm-se, mas apenas estão ligados ao desbloqueio de skins para Crash e Coco. Na dúvida entre qual dos dois sistemas seria o melhor, a solução optada pelo estúdio de desenvolvimento foi simples e eficaz: dar a possibilidade de escolha ao jogador na forma de jogar que mais se adapta aos seus gostos e preferências.

Disponível em: Nintendo Switch, PS4, PS5, Windows, Xbox One, Xbox Series X|S

Luís Ferreira

Rating: 3 out of 4.

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