O Presente
Um homem idoso, sentado à frente de um computador, digitava alguns comandos no teclado, quando uma mensagem da internet interrompeu-o de repente. Levantou-se e começou a ajustar alguns controles em diversos equipamentos eletrónicos espalhados pelo cómodo onde estava. As janelas escuras não deixavam passar quase nenhuma luz vinda do lado de fora, e só uma lâmpada iluminava o ambiente. Quando ajustou o último aparelho, o homem sentou-se novamente à frente da tela do computador e pressionou a tecla enter. A imagem de um rapaz apareceu.
— Irmão, podemos falar? — perguntou o rapaz do outro lado da linha.
— Sim, irmão. Já ajustei os equipamentos, e ninguém poderá ouvir ou mesmo gravar nossa conversa.
— Ótimo! Confirmamos o nome do próximo alvo de sua missão: Gabriel dos Santos. Ele estuda à tarde na Escola Geraldo Bittencourt. Tem doze anos e está na sexta série. Vou enviar a ficha completa do menino para o seu computador.
— Obrigado, irmão. Eu já sabia quem era e só precisava de uma confirmação. Agora posso entrar em ação. Esse menino vai ter uma surpresa tão grande, que sua vida nunca mais será a mesma.
A conversa continuou, e longe dali, na Escola Geraldo Bittencourt, Gabriel contava cada segundo em seu relógio para o término da aula. O professor de matemática da sexta série era o mais rigoroso da escola, e na sala de aula do menino ninguém dava um pio sem levar bronca. Uma linda menina de cabelos compridos e encaracolados passou um bilhetinho para Gabriel. Era a única forma de se comunicar durante a aula do professor Sérgio. “Por que você tá tão preocupado com a hora, Biel?”, dizia o bilhete. “Tem algum encontro marcado?”
O garoto virou-se para a namorada e sorriu. Sandrinha adorava aquelas brincadeiras e sabia que o namorado conseguia relaxar-se com elas. Funcionou também desta vez. O sinal do fim da aula tocou e todos os alunos se levantaram ao mesmo tempo, como se estivessem contando o tempo também.
— A sua encomenda chega hoje, não é, Biel? — perguntou Sandrinha. — Quero ver se você vai ficar contando o tempo assim no dia do nosso casamento.
— Só você consegue me fazer rir numa hora dessas. Eu não vejo a hora de chegar em casa, Sandrinha!
O casal caminhou até as peruas do lado de fora da escola. Antes de embarcar, Gabriel teve que saciar a curiosidade de seu melhor amigo também.
— Biel, é hoje que chega o seu presente? Posso ir lá na sua casa pra ver?
Cadu insistiu até o menino concordar. Gabriel e Sandrinha entraram no veículo, e quando este partiu, ambos comemoraram. Cadu seguiu para a casa do amigo em sua bicicleta.
Da escola até a casa de Gabriel eram somente quinze minutos de carro. O menino já estava com as chaves da casa na mão quando o transporte escolar parou à sua porta. Gabriel desceu primeiro e em seguida, sua namorada. Mal abriu a porta, começou a gritar:
— Manhê, o carteiro já passou? Ele deixou alguma coisa pra mim?
Ivone, a mãe do menino, cabelos escuros e cacheados, apareceu com um embrulho. Cadu chegou nesse instante.
— Calma, filho! Uma pergunta de cada vez!
Com um imenso sorriso no rosto, o garoto só faltou arrancar as mãos de sua mãe ao pegar o embrulho. Cadu e Sandrinha olhavam com expectativa Gabriel desembrulhar sua encomenda. Quando terminou, ficaram boquiabertos.
— Essa aí que é a tal máquina do sorteio, filho?
A pergunta de Ivone ficou sem resposta. Sandrinha falou:
— Nossa, que legal! Será que é de verdade?
— É claro que é, Sandrinha! — disse Gabriel. — O site que fez o sorteio é da revista de fotografia que eu compro. Eles não iam fazer um sorteio falso, né?
— Liga ela pra gente ver, Biel.
O menino assentiu e todos foram para o seu quarto. Depois de encaixar o carregador na máquina e na tomada, ligou-a. Uma pequena tela iluminou-se, e Gabriel começou a explicar o funcionamento de sua nova câmara fotográfica.
— Quer dizer então que o seu namorado agora vai virar um fotógrafo de verdade, não é?
— Ó… Sandrinha… se você entendeu alguma coisa que o Biel falou, me explica, por favor!
A menina começou sua explicação. Gabriel mexia nos botões e controles da máquina para ver o que cada um fazia. Aos poucos, foi se lembrando da velha máquina que ganhara do pai. A paixão do menino pela fotografia começou dois anos antes, desde que houve uma exposição de um famoso fotógrafo da cidade em sua escola. No mesmo dia, Gabriel decidiu: “Vou ser fotógrafo quando crescer”. Só tinha uma pessoa que o fazia esquecer um pouco aquela arte: Sandrinha, sua namorada.
— Posso ver, Biel? — perguntou a mãe do pequeno fotógrafo.
O garoto nem sequer deixou sua mãe tocar na máquina, e foi logo avisando:
— Ninguém vai mexer na minha câmara, mãe!
Ivone fez uma careta para o filho e saiu. Gabriel não se cansava de alisar o seu presente e sorrir.
Wandson DeSilva
“A Máquina da Verdade” é um romance lançado em 2020, sendo o 1.º livro do escritor brasileiro Wandson DeSilva enquanto profissional da escrita. A história é repleta de aventura, suspense e mistério, tendo já conquistado inúmeros leitores. O livro foi lançado na cidade de Bela Horizonte e já atravessou o atlântico, tendo chegando a Portugal.
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