O livro “Banquete com os deuses”, com o subtítulo “Cinema, literatura, música e outras artes” (Editora Objetiva, 2003, 228 páginas) do escritor brasileiro Luis Fernando Verissimo é excelente! O autor convida-nos a saborear grandes lembranças da sua vida cultural, nas artes que o inspiraram e o tomaram de assalto. Vale como uma super indicação de obras culturais, especialmente para aqueles que estão a enfrentar o distanciamento social nesta época da covid-19.
Luis Fernando é um introvertido escritor de Porto Alegre, capital do Estado do Rio Grande do Sul. Conta o anedotário popular que ele é de uma timidez desmedida. Um amigo, o filósofo clínico Hélio Strassburgger, confidenciou-me que certa vez na capital gaúcha ocorreu uma homenagem a Erico Verissimo (já falecido), pai de Luis. No protocolo de homenagem, concederam a palavra ao filho. Ao ser chamado para discursar, o escritor foi expansivo: “Muito obrigado!” – resumiu. Uma saia justa e ele lá, tímido e recatado. Apenas uma paixão o desinibe completamente: tocar saxofone em bares de jazz de Porto Alegre.

E é na música que Verissimo desnuda a sua paixão pelas indicações de jazz que dá no livro. Confesso ser um completo ignorante na história do género, mas vale a pena a leitura.
Na literatura, por vezes Verissimo trava diálogos imaginários com o argentino Jorge Luis Borges e reclama do facto de Jorge Amado, amigo do seu pai, meter na cabeça que o nome dele era João e não Luis Fernando. Discorre sobre Oscar Wilde e destila frases corrosivas do dandy irlandês. Na crónica “Sartre e Huston“, lembra as memórias deste último que disse ter se impressionado com Sartre, pois este falava sem parar, sendo que Huston o deixou a falar sozinho para ir à casa-de-banho e quando voltou o filósofo francês continuava a falar, ao que ele percebeu que tanto fazia se ele estava presente ou não.
É no cinema que o gaúcho nos fornece as melhores dicas. Os filmes são pesos-pesados: “Os Homens do Presidente” (1976), “JFK” (1991), “Apocalypse Now” (1979) e até a água com açúcar “O Diário de Bridget Jones” (2001). Dos realizadores, fala de um talentoso Woody Allen, de Fellini e do “Mestre do Suspense” Alfred Hitchcock. Lembra a ingenuidade de Carlitos de Chaplin e discorre acerca do grande amor de um gorila gigante por uma pobre humana no clássico “King Kong“, escrevendo um final alternativo onde os dois se casam, sendo que a sogra implica com o genro e atenta para os gostos duvidosos da filha.

O estilo traz um humor refinado, quase inglês, e é um paradoxo entre timidez e fazer rir através de palavras tão bem ajustadas. Verissimo construiu uma carreira sólida escrevendo para grandes jornais do Brasil e, de tempos em tempos, livros são publicados reunindo algumas das suas melhores crónicas, estilo que domina com desenvoltura.
Confesso que foi o primeiro livro que li dele, certamente estava acostumado às crónicas nos jornais, mas já me fez percorrer o catálogo e encomendar os outros livros: “As mentiras que os homens contam“; “A mesa voadora“; “Comédias para se ler na escola“; “Sexo na cabeça” e “Todas as histórias do analista de Bagé“. O analista de Bagé, cidade do Rio Grande do Sul, é um clássico personagem inventado por ele. Todos estes livros pelo selo Objetiva.
Então é isso, nestes tempos meio sombrios de covid, encomendem os seus livros para desopilar um pouco o fígado. Gostei bastante desta experiência.
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