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Porque A Arte Somos Nós

William S. Burroughs (1914-1997) começa a experimentar a linguagem bastante cedo na sua carreira, principalmente, com a escrita não-linear depois do livro semi-autobiográfico “Junkie“. Publicado em 1959, “Naked Lunch” (na tradução portuguesa “Refeição Nua“) está organizado de tal forma que os capítulos podem ser lidos em qualquer sequência e, a nível de conteúdo, há mudanças constantes no assunto que podem, completamente, confundir o leitor. Para Burroughs, as frases que ele compõe, através do método cut-up, procuram representar de muito mais perto a realidade do que os escritos de uma forma tradicional.

Burroughs quer, no fundo, trazer a escrita até onde a pintura está. O método de colagem é muito mais próximo dos factos da real perceção humana do que a escrita de representação, o que corresponde à pintura.

O escritor norte-americano William Seward Burroughs II

A associação a que essas experiências são constantemente relacionadas procuram, constantemente, centrar-se em junk, como drogas, especialmente a heroína, vício do qual Burroughs se foi libertando, tal como lixo cultural. Assim, o autor procura com estes estados, como a droga ou a sua indução, assimilar os detritos flutuantes e as imagens soltas da vida norte-americana contemporânea.

Burroughs também eleva o uso de cut-ups para um nível sociopolítico. Esta técnica adapta-se perfeitamente à sua missão de ação contracultura, como um meio revolucionário de quebrar o controlo ditado pela narrativa linear, um meio de composição representado pelo estado mental perturbado e pelos sentidos sem drogas. Assim, Burroughs não só desafia a linearidade, como também a irreversibilidade. Embora a técnica de cut-up seja representada como uma descoberta, o método de Burroughs, sempre presente nos seus trabalhos, assemelha-se à pintura moderna. Este método já havia sido utilizado, como a colagem, por um longo período de tempo, de uma forma semelhante ao da fotomontagem usada na fotografia.

Existe uma ligação clara entre os trabalhos de Burroughs e o movimento surrealista dos anos 30. Como os surrealistas, Burroughs quer revolucionar tanto a pessoa como a sociedade e combina as experiências diárias com o surrealismo. Os cut-ups levantam frequentemente imagens de sonhos, um motivo que foi determinante no surrealismo, pois estas imagens procuram assumir uma forma de alucinação, do inconsciente ou do erotismo.

Em 1991, “Naked Lunch” teve uma adaptação cinematográfica. Esta ficou ao encargo do cineasta David Cronenberg, e no papel de personagem principal foi Peter Weller quem assumiu a responsabilidade

O estilo romance é um produto derivado do facto da história ser contada por um junkie. O leitor vê o mundo através dos seus olhos e experimenta os efeitos das drogas: a fragmentação, a paranoia, as alucinações. Ao considerar “Naked Luch”, não na perspetiva histórica mas num formato mais teórico, a linguagem tem uma mensagem mais política, visto que o escritor sente que há uma preocupação sincera para as funções da sociedade moderna.

O objetivo da forma experimental serve para deixar o leitor experimentar novos significados da linguagem, assim como possíveis formas através de uma combinação improvável de palavras familiares. Também serve como um sinal de alerta para a sociedade que empurra todos para a conformidade. As pessoas dizem o que comprar, o que pensar; na verdade, elas dizem quem são, mesmo sem perceber que isso está a acontecer. Através de uma forma escrita não convencional, Burroughs quer fazer soar o alarme e consciencializar as pessoas disso mesmo, incitando talvez a ação.

João Filipe

Rating: 4 out of 4.

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