A vida de um dos génios mais conhecidos de toda a história foi transformada numa série, em 2013, por David S. Goyer e revelou-se um enredo verdadeiramente poético e digno de honrar uma personalidade tão irreverente como foi Leonardo da Vinci.
Interpretando o artista icónico temos Tom Riley, cuja performance fez jus à mente complexa e tão singular de Da Vinci. A série de três temporadas conta-nos uma história ficcional de como teria sido o mundo de Leonardo Da Vinci no início da sua vida adulta. Filho bastardo e génio incompreendido, o nosso protagonista luta constantemente contra a Igreja Católica que não aceita a sua perspicácia e clara evolução mental e acaba ainda por se envolver em vários desentendimentos com os Medici, a família mais poderosa de Florença.
Apesar de ficcional, esta série consegue retratar muito bem um possível cenário para a vida de tão controversa personalidade histórica. No entanto, também tem, claramente, alguns factos como base e recorre muitas vezes a eventos da vida de Leonardo que se conhecem, encaixando-os na história, como por exemplo os escândalos sexuais e a própria orientação sexual do inventor, os seus problemas constantes com a igreja e mesmo muitas das suas criações.

A magia por detrás desta série reside, sem dúvida, na forma como mostra, sem filtros e sem pudores, a dificuldade, a solidão e a incompreensão que Leonardo sentia no século XV, em Itália, sendo um génio descomunal. O pensamento de mesmo foi em si uma revolução histórica, depois transportado para a índole das suas obras. Ao longo das três temporadas somos testemunhas disso mesmo: uma mente com muitos demónios interiores e que não pode ser contida a nenhum custo, levando-a, assim, a lutar constantemente contra si própria e contra um ambiente onde não se encaixa.
Falando da série em si, os cenários são impecáveis: as igrejas, o palácio dos Medici e mesmo o atelier de Leonardo que reflete muito bem a sua mente imparável e extremamente desenvolvida. Para além de toda uma imagem incrível de uma Florença Renascentista, conseguimos também perceber os dotes deste artista e o que o levou a ser inesquecível: a pintura, a escultura, a invenção, a escrita – todos estes campos dominados e explorados com intensidade ao longo dos episódios de forma a, mais uma vez, introduzir os factos históricos numa série ficcional.
Apesar de tudo isto, a história em si não fica apenas por Da Vinci, mas introduz-lo numa aventura de auto-descoberta em busca d’O Livro de Folhas, o mistério que o persegue através de visões e pesadelos. Este livro seria a resposta para tudo e levou mesmo a que Leonardo conhecesse a sua mãe e a história dos seus progenitores.
Esta é a trama global e que é, claro está, a parte ficcional da série. Outro aspecto que é elaborado de forma consistente e que resultou muito bem ao longo das temporadas é um evidente desenvolvimento e evolução na atitude e personalidade de Da Vinci, que começou como um jovem um tanto egoísta e presunçoso para acabar a série como um adulto pronto a ceder e compreender os outros à sua volta.

Portanto, a série como um todo está muito bem conseguida – a nível histórico não podemos esperar um retrato exato de todos os factos, mas sim uma exploração transcendente destes e das motivações por detrás dos mesmos; a um nível exterior aos factos, temos uma série extremamente agradável e mágica capaz de desenvolver a nossa mente, elevando-a à mente do polímata mais criativo de todos os tempos. O único defeito que posso realmente apontar seria na terceira temporada, onde muitas pontas ficaram soltas, muita coisa fica por dizer e o final é um pouco apressado. Por isso mesmo não é de espantar que os produtores estejam a pensar numa minissérie para dar um desfecho digno de um enredo excecionalmente elaborado.
Dito isto só posso recomendar esta série a todos os aspirantes a polímatas da nossa época e a todos os admiradores de uma personalidade tão irreverente e simplesmente inesquecível, cuja mente ultrapassou todos os limites conhecidos ao homem e foi capaz de voar por cima das expectativas de todos. Uma série que marca pelo visual, pelo sentimento e pelo intelecto – simplesmente indispensável e imortal.