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O livro “Casagrande e seus Demónios“, de Casagrande com o jornalista Gilvan Ribeiro (Globo Livros, 242 p.) foi degustado em dois dias: foi assim que li esta biografia de Walter Casagrande Júnior, ex-atacante do Corinthians, FC Porto e Seleção Brasileira, hoje comentarista desportivo da TV Globo, do Brasil. Um livro tocante, pois conta o drama vivido por Casão numa luta ferrenha contra a dependência química, adversário muito mais atroz do que a maioria dos adversários que enfrentou nos campos de futebol.

O mérito do livro foi ter despido completamente o hoje comentarista, não dourando a pílula nem encontrando culpados para as derrapadas de Casagrande. E foram tantas! Em rede nacional, num dos programas globais de maior audiência da TV aberta, Domingão do Faustão, fez confissões públicas e familiares acerca do seu drama. De ressaltar a enorme força de vontade de Casagrande em dar a volta por cima. Dependente químico, luta contra todos os seus demónios internos (e eles existiram de facto, basta ler sua biografia), mas vem rolando seus dados com muita personalidade e autenticidade. Mantém-se “limpo” agora.

Walter Casagrande Júnior

Traço marcante da sua personalidade, é o seu jeitão diferenciado desde os tempos de jogador do Corinthians. Jogador de futebol gosta de pagode e cerveja? Casagrande gosta de rock internacional e nacional, fazendo inclusive ao longo dos tempos amizades com bandas como os Barão Vermelho e Titãs. Jogador de futebol é alienado dos problemas sociais? Casagrande, ao lado dos colegas de time Wladimir e Sócrates, engajou-se na luta pelas “Diretas Já”, praticando no seu ambiente de trabalho a Democracia Corintiana, quando o Brasil vivia os seus últimos momentos de governo militar.

Jogador de futebol tem péssimas amizades? Casão era amigo e terminou amigo de uma das cabeças mais diferenciadas do futebol brasileiro: o Doutor Sócrates, o Magrão. Jogador de futebol tem dificuldades para falar? Casão era e é bastante articulado ao sair sempre do “lugar comum” tão frequente nas análises de jogo.

Particularmente, cresci assistindo a jogos de Casagrande pelo Corinthians e Seleção Brasileira. Menino ainda, aos 11 anos, assisti aos jogos das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1986, no México, e nas partidas que o Brasil fez contra a Bolívia e Paraguai, não me sai da cabeça aquele timaço armado pelo Telé Santana: Carlos, Leandro, Óscar, Edinho e Júnior; Falcão, Sócrates e Zico; Renato Gaúcho, Casagrande e Éder Aleixo. O jeitão desengonçado e irreverente de jogar de Casagrande me chamava bastante à atenção.

Casagrande e o escritor Gilvan Ribeiro

A sinceridade desconcertante nos depoimentos de Casagrande a Gilvan Ribeiro é elogiosa e convida-nos a ler este livro tão palatável, não apenas para os amantes do futebol. Independentemente do clube pelo qual se torce, as lições de vida apresentadas nele constituem ensinamentos dos mais úteis, a lembrar de que a batalha no jogo da vida é uma partida muito mais difícil de se conseguir títulos.

Ao Casagrande, os parabéns pela luta diária, por manter a sua personalidade forte e “desconcertante” e o prazer de ver sempre as suas análises do jogo bastante pontuais e agudas. Finalizando, chamo a atenção para a capa do livro, com um Casagrande abatido e com olheiras, fazendo jus ao título que aponta companhias tão detestáveis como “demónios”. O livro possui excelentes ilustrações e quebra a todo o tempo o ritmo da leitura, tão caprichosamente elaborada pelo experiente Gilvan Ribeiro.

Marcelo Pereira Rodrigues

Rating: 2.5 out of 4.

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