O cinema é um novo espaço onde conseguimos ir buscar significação. É quase que uma catarse múltipla e contínua da nossa alma, do nosso pensamento e até — ou talvez sobretudo — daquilo que está obscuro em nós. Perante aquela bonita ideia de que não há cinema sem literatura, sem um guião, sem um argumento, torna-se impossível dissociar estas duas (ir)realidades. O cinema é capaz de conjugar a vertente visual e poética, projectando uma história quase para um patamar de difícil acesso.
Todos somos convidados a retirar do mundo cinematográfico uma nova concepção, uma nova forma de viver, um novo marco para coexistirmos. Mas se o convite é assim tão belo, será igualmente fácil agarrar e encarar esta oportunidade metafórica com unhas e dentes? Neste diálogo sem fim com a nossa cultura e com o (des)conhecimento que temos de nós, a nossa mente é o gatilho, o que espoleta a nossa vontade intrínseca de compreender o incompreensível.

O cinema é um estudo intenso e pessoal daquilo que somos, daquilo que fomos e daquilo que podemos ser. No interlúdio, encontramos na genialidade de alguns cineastas e escritores exímios o apanágio de expoente máximo da arte. A verdadeira arte do nosso mundo está, precisamente, no nosso reportório humano, intelectual, emotivo, sentimental, (ir)racional, etc., e o Cinema pega precisamente nisso para elevar aquilo que somos.
Entre cinematografia e edição (sonora e visual), a sétima arte afigura-se como um meio extremamente completo de reproduzir a vida no grande ecrã. Questão eterna do nosso tempo diz respeito a: será que a arte imita a vida ou a vida imita a arte? Eu diria que a resposta está precisamente num meio termo saudável. E é mesmo esse meio termo que permite manter a ligação entre a realidade física e a ficcional, sem nunca separar aquilo que transportamos para a experiência daquilo que sentimos durante o tão saudável delírio.
Mas a verdadeira magia inerente ao contracto tácito entre o espectador, os protagonistas e os obreiros de ante-câmara resulta de uma humildade, de um sentimento de pura troca de impressões, sentidos e concepções, numa fruição desprovida de lucros a não ser os de alavancar conhecimento, cultura e consciencializações (ainda que subjectivas). A partir daqui, a experiência é conduzida quase que instantaneamente e sem um limite pré-definido, a não ser o tecto criativo — se é que existe — de sonhar.

Felizmente, os factores externos são desvanecidos quando no cinema nos arriscamos a ir mais além e a não deixar que os preconceitos nos guiem na nossa expressão. É essa a beleza interior adjacente a esta forma de contar o que somos, como vemos o mundo e como achamos que o mundo nos vê.
Ver um filme é sair da realidade e abraçar novos futuros. O realizador tem a missão de guiar formas narrativas, de conduzir como a história é contada e o que passa para fora (ou para o interior). Os argumentistas têm a missão de cativar pelo conteúdo, pela essência daquilo que se conta e que se mostra. E é só através de uma máquina bem oleada, de uma conjugação crítica, de uma união artisticamente infinita que se consegue captar as atenções do auditório e, acima de tudo, tocar o público, no cerne mais catártico e puro possível.
Tudo isto põe a descoberto um amor ingénuo, sem restrições, pela beleza de contar uma história. E todos precisamos de algo capaz de nos transcender, de nos libertar da prisão mental que irracionalmente todos sentimos e, desta forma, conseguirmos ampliar os nossos horizontes, sem nunca descorarmos a verdadeira história, a história do mundo real onde todos nós somos protagonistas e onde podemos — e devemos — fazer a diferença no mundo.
Por um cinema feliz.
Tiago, o seu texto reflete muito bem aquilo que passou a se denominar a Sétima Arte! Parabéns!
Muito obrigado, Marcelo. É um texto pessoal, mas acima de tudo uma visão que tenta ser universal quanto à beleza intrínseca desta bonita forma de arte. Abraço