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Porque A Arte Somos Nós

Se havia um artista português que dava um filme, António Joaquim Rodrigues Ribeiro (antes de ser “Variações”) estava sem dúvida no topo das solicitações. Viajado, ousado e talentoso são algumas das qualidades do homem que muitos diziam estar “à frente do seu tempo”. Ao ponto das suas canções pop rock perdurarem décadas depois de ter sido precocemente roubado pela doença. Portugal não esquece, Portugal não esquece.

A realização de “Variações” é do estreante João Maia, que escreveu o argumento com o auxílio de Karen Sztajnberg. Juntos elaboraram uma história cujo foco está nos anos em que António Variações (Sérgio Praia) era apenas António Ribeiro. Um barbeiro entusiástico, liricista não por formação mas por intuição. Por entre dissabores amorosos, divergências com a editora discográfica e com as bandas onde cantava, a biografia explora como é que ‘Toninho’, chamado carinhosamente pela mãe (Deolinda de Jesus), se tornou um ícone da música portuguesa.

Há uma cena solene logo nos primeiros instantes desta produção. António é muito novinho e está a trabalhar numa fábrica. Música começa a tocar na rádio. É Amália. Todos os esforços cessam, porque se vai cantar o fado. É bonito de se ver e ouvir, espelhando o apreço que o filme tem pela música, não só de Amália – que seria uma grande influência para António – como também do protagonista. Há diversas sequências onde vemos o cantor a ensaiar e a atuar, com uma vibração própria e peculiar.

Sérgio Praia (esquerda) e Filipe Duarte (direita)

Não sou eu que me tenho de adaptar a Lisboa, é Lisboa que se tem de adaptar a mim“, explica Sérgio Praia, que encarna o performer com brio. É a sua prestação ilimitada que prevalece sobre um filme que peca por ser excessivamente tímido e desnorteado. O enredo é demasiado passivo e nota-se falta de impacto dramático. Acaba por ser um estudo de personagem raso sobre alguém que era tudo menos isso. Praia vai certamente além do papel em “Variações”, tal como Filipe Duarte (Fernando Ataíde), que interpreta o seu interesse sentimental.

O guarda-roupa e a direção de arte são fiéis ao Portugal do final dos anos 70, sendo o vestuário de António sempre mais vistoso do que o dos seus pares. Por outro lado, a fotografia fica aquém em algumas cenas, não apenas por falta de dinamismo nas sequências musicais, como também pelo ocasional desfoque nos contornos da imagem. Uma decisão artística que distrai mais do que cativa.

A realização segura e pedestre de João Maia acaba por não favorecer uma história que pedia maior complexidade e desenvolvimento da sua personagem central. Não fica na memória, mas tem o suficiente para fazer bater o pé e homenagear alguém que olhava muito além da fama e dinheiro. Alguém que, tal como todos nós, só queria fazer o que gostava.

Bernardo Freire

Rating: 2 out of 4.

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