No segundo romance de Sally Rooney, “Normal People”, somos testemunhas de uma história maior que nós mesmos. Marianne, pouco popular e extremamente inteligente, é o tipo de pessoa considerada “estranha”, pois vive no seu mundo e pouco lhe importa o que os outros pensam da sua aparência, das suas atitudes ou da sua vida. Connell, o típico rapaz popular, desportista e adorado por todos. Estes são os nossos protagonistas, cada um personagem principal na história que os une, mas sempre personagens secundárias da vida em si. A maneira como se começam a relacionar inicia-se de uma forma muito peculiar e bizarra, mas, de certa forma, mágica, evidenciada pela química, pela ligação e pela complementaridade entre os dois.
O livro passa-se ao longo de anos, anos nos quais o amor entre Connell e Marianne anda desencontrado. No último ano do secundário, estes têm um envolvimento romântico às escondidas que “termina” com a mesma espontaneidade com que começou. Connell tem dificuldade em assumir não só uma relação com Marianne, mas também de assumir a sua verdadeira natureza. Na universidade, os papéis parecem inverter e Marianne mostra-se muito mais à vontade neste novo mundo e Connell um pouco deslocado.
O que torna esta obra não só brilhante como também um oásis no mundo dos romances mais convencionais é o facto de nos elevar a um amor diferente; um amor que nunca começa, mas que também nunca acaba. Um amor que simboliza a efemeridade do próprio amor, bem como a ligação eterna que este representa. Os anos passam e não somos capazes de parar de ler (literalmente); é um livro para devorar em três dias – ou menos.

Não tem um enredo elaborado, não tem personagens com histórias fantasticamente complexas, tem sim uma intensidade inerente, um fogo que alimenta a linha do tempo, uma busca incessante por algo que se sabe não ser possível sequer obter. A história passa-se num plano muito diferente daquele que realmente lemos; como já dizia o principezinho “o essencial é invisível aos olhos“.
Rooney aborda temas como a sexualidade, a expressão desta última, o desenvolvimento emocional, os relacionamentos interpessoais, todos eles durante a adolescência e a vida adulta. Estes temas são realmente interessantes ao ponto de nos perguntarmos se certas atitudes, comportamentos ou até pensamentos a nível sexual são resultado de traumas, situações e vivências em geral das personagens.
O que realmente me fascinou durante o processo que é interiorizar um livro da dimensão emocional e psicológica que é “Normal People”, é simplesmente a forma como estas duas pessoas, tão diferentes e tão semelhantes, estão tão desencontradas como unidas. Amam-se, mas não estão juntas; desejam-se, mas não estão juntas; tudo isto apenas mostra que há amores irrealizáveis ainda que ideais e, à primeira vista, impossíveis de escapar. O que é realmente impossível de escapar é a ligação que os dois carregam e valorizam tão preciosamente.
Não estão juntos, mas estão sempre juntos, estão sempre um do lado do outro, um a segurar a mão do outro, um só. Este amor que, no início da história, nos pareceria o primeiro amor na adolescência, tornou-se em algo muito maior para os dois e mesmo para o próprio leitor que se apercebe da evolução e começa a ver tudo de uma perspetiva muito mais universal e num plano muito maior.

Sally Rooney é um génio em ascensão capaz de fugir aos romances dos finais felizes e dar-nos um final real, aliás, mais que real – um final digno deste amor fora da perspetiva dos próprios intervenientes. O mais bonito no sentimento entre os dois é realmente a evolução que se vai dando ao longo das páginas. O amor que começou escondido e que cresceu timidamente, tornou-se num amor privado, mas visível.
Isto porque, como já referi anteriormente, Connell sempre teve muito medo da opinião alheia e não foi capaz de mostrar ao mundo os seus sentimentos por Marianne; ainda assim, nos momentos finais, Connell é capaz de dizer, sem medos e sem receios o quanto a ama e tudo se torna claro para ele, para ela, e para o leitor. A evolução das próprias personagens é fantástica, passam ambos por momentos complicadíssimos, por experiências devastadoras e acabam sempre nos braços um do outro. No final, ambos amadureceram e lidam muito melhor com a relação que têm e não têm.
Só posso terminar dizendo o quão mágica, dolorosa, devastadora e gratificante foi a experiência de ler “Normal People”. Mágica porque fez-me sonhar, dolorosa porque a vida é assim mesmo, devastadora por ter terminado, gratificante por ter sequer existido. O livro termina com Marianne refletindo sobre a forma como ambos mudaram a vida um do outro e com a frase “I’ll always be here” (“Eu estarei sempre aqui“), o que resume perfeitamente, ainda que de uma forma simples, este amor efémero e infinito.
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One thought on ““Normal People”: A fatalidade do fatalismo”