Depois do sucesso da série “Deadwood“, que teve a duração de três temporadas (2004-2006), o seu final ficou sempre em aberto, de forma que a cidade conhecida pelo crime e pela prostituição, regressou aos ecrãs das nossas casas para finalmente pôr um ponto final no destino da comunidade. Produzida pela HBO, a história da cidade situada no estado de Dakota do Sul passa-se cerca de dez anos após o último episódio da série, mais precisamente em 1889. Os personagens principais são os mesmos, com a particularidade de estarem mais velhos, alguns com um visual mais desgastado do que seria de esperar para um intervalo de dez anos. Pouco ou nada mudou nas rotinas da cidade, com especial menção para a chegada do telefone a terras de Deadwood. Contudo, somos constantemente confrontados com um passado mal resolvido por parte de vários personagens – tal é focado com pequenos fragmentos de episódios passados ao longo da narrativa.
O grande destaque da história centra-se na disputa de poder entre o xerife Seth Bullock (Timothy Olyphant) e o investidor (agora Senador) George Hearst (Gerald McRaney), que após o retorno deste último a Deadwood, a sua vontade em adquirir um terreno estrategicamente importante veio de novo perturbar a harmonia no faroeste. Não é difícil de adivinhar que para o conseguir, Hearst tenta à força passar por cima de tudo e todos, mesmo que isso traga “baixas” importantes. Sendo que uma das figuras-chave de toda a série está em baixo, Al Swearengen (Ian McShane), cabe a Seth Bullock fazer o papel de herói na história.
Realizado por Daniel Minahan, que já havia participado em quatro episódios da série, e escrito por David Milch, o criador da mesma, “Deadwood” segue uma linha de desenvolvimento muito idêntica ao seu formato série. A um ritmo relativamente pausado, vamos sendo confrontados com as personagens que nos disseram “ate já” em 2006, como por exemplo Alma Ellsworth (Molly Parker), Trixie (Paula Malcomson), Charlie Utter (Dayton Callie), ou Sol Star (John Hawkes). A primeira está de volta à cidade com a sua “filha” Sofia (Lily Keene), e quando ambas chegam ao seu destino final, podemos ver que Deadwood está um pouco diferente, mais moderna. Um processo natural com o passar dos anos que não foi deixado ao acaso por parte da produção, que transporta consigo um dos pontos fortes do passado: a caracterização. Desde Trixie estar grávida a Mr. Wu (Keone Young) ser avô, a vida não parou no faroeste e as rugas também passaram a ser um destaque.
O centro da acção passou do Gem Saloon para toda a área circundante, com pequenos eventos a acontecer aqui e ali, respeitando sempre a dinâmica de uma cidade em crescimento em finais do século XIX. Seth Bullock é agora pai de três crianças e dono de um hotel, a concorrência de E.B. Farnum (William Sanderson), um personagem pouco interessante que teve sempre um papel de alguma importância nos principais eventos. Bullock ganha particular importância a partir do momento da morte de Charlie Utter por parte dos homens de Hearst, onde o escalar de violência só é cortado graças ao casamento de Trixie e Sol. Aliás, o contraste de emoções para o espectador é mais sentido neste formato filme, pois com este último “acto”, muitas relações chegam a um ponto de ruptura ou de união. Exemplo deste último caso é Joanie Stubbs (Kim Dickens) e Jane (Robin Weigert), que acabam por encontrar uma na outra um sentimento muito especial – algo um bocado chocante à altura.
“Deadwood” acaba por ser uma obra necessária, obrigatória para os fãs que seguiram a série até ao fim. Para esta última estava prevista uma quarta temporada, que nunca se chegou a realizar. Tendo em conta esta “não-conclusão”, e o facto de certas séries terem “voltado” com um filme final – como é o caso de “Breaking Bad” (2008-2013) com “El Camino: Um Filme de Breaking Bad” (Vince Gillian, 2019) – os criadores da famosa cidade do faroeste decidiram também pôr um ponto final já há muito aguardado. E penso que o fizeram bem. A obra nunca perde a mística criada há já mais de uma década, o que por si só revela uma vontade de dar aos fãs o que eles merecem, e não prolongar desnecessariamente uma história que pouco mais tem a oferecer.
Assistimos à evolução da sociedade, onde no fundo pouco ou nada mudou: os bons acabam sempre por ter um final trágico. Já no passado a série havia sido um pouco underrated, ou por vezes descartada do pódio, mas na realidade a sua cinematografia é um excelente exemplo de como retratar fielmente o interior dos Estados Unidos no século XIX. Este é um filme mais sentimental e filosófico, comparativamente à sua série, sempre com as melhores afirmações a pertencerem ao carismático e sábio, Al Swearengen. É um retrato sobre vingança onde homens fazem a justiça pelas suas próprias mãos.