A Igreja Católica está a perder a guerra contra o Diabo. Há uma crise avassaladora de possessões demoníacas a nível global. A resposta do Vaticano? Reabrir as academias para os padres aprenderem e treinarem o ritual do exorcismo. Este é o pano de fundo urgente de “Prey for the Devil” – em português “A Luz do Diabo” -, realizado pelo alemão Daniel Stamm. Parte do par de longas-metragens infernais anuais que estão destinadas a cair no esquecimento e a acomodar o discurso conservador de que já não se faz terror endiabrado como nas décadas de 1970 e 1980.
De crucifixo em punho está, desta vez, a Irmã Ann (Jacqueline Byers). Empática e amável por natureza, Ann não teve uma infância fácil. Acredita que a sua mãe vivia atormentada por uma entidade paranormal que a forçava a fazer coisas que não queria. Forçava-a a fazer-lhe mal. Este facto, aliado à sua curiosidade, fazem-na traçar um objetivo sem precedentes na Igreja: tornar-se a primeira mulher exorcista. O Padre Quinn (Colin Salmon) vê potencial na ideia e cedo Ann afeiçoa-se ao processo de Natalie (Posy Taylor), que está perto de transitar para um caso terminal de possessão. Conseguirá salvá-la? Passado e presente entrelaçam-se para por à prova as capacidades da protagonista.

Quem não foi propriamente desafiado fui eu. Genérico do início ao fim, o principal ingrediente ativo no argumento de Robert Zappia é o menosprezo do papel da mulher nos anais religiosos. Com Ann, surge a possibilidade de uma reforma canónica na estrutura da Igreja. Disrupção que, em tempos de colapso espiritual, pode terminar com uma hierarquia anacrónica e fortalecer a fé dos possuídos. Segundo o filme, a tese que justifica a mudança baseia-se na capacidade ímpar que as mulheres têm em chegar ao outro pela ternura e assistência. Virtudes que estão para lá das escrituras.
Ann personifica estas qualidades. É uma presença agradável – ainda que um tanto passiva – no grande ecrã. Vemo-la a deambular pela escola e a ser perseguida por uma voz que tenta comunicar com ela. A ação desenrola-se recorrendo a tensões clínicas, destituída de pulso ou subenredos pertinentes. A monotonia e a impotência emocional de “Prey for the Devil” são, assim, as suas maiores fragilidades. Perto do final, quando corpos são arrombados e gritos dilacerados, já estava demasiado adormecido. Sensação que se prolongou até efetivamente adormecer nesse dia.
O meu estado letárgico deveu-se, também, à realização de Stamm, que não é estranho ao universo dos batismos com fogo. Em 2010, ao leme de “O Último Exorcismo“, um exercício em formato found footage, não teve qualquer receio de sujar as mãos e oferecer suspense maligno com desenvolvimento de personagens algo interessante. Em contraste, “Prey for the Devil” é um trabalho domesticado, receoso de arriscar na forma e completamente ordinário no que diz respeito à execução dos horrores.

Saltei em três breves instantes, consequência de sustos vazios e preguiçosos. Carecem do fator perturbador que tanta diferença pode fazer numa produção do género. Um imaginário mais tenebroso, drama mais pujante ou até a redução da quantidade de clichés em jogo. Regurgitar procedimentos inspirados em centenas dos seus homónimos não é suficiente para conjurar uma sessão intrigante.
É lamentável porque, neste caso, o espaço da narrativa tinha algum potencial. Desde a sala de aula e biblioteca até às masmorras subterrâneas, o filme devia ter sido mais atrevido. Fazer mais e melhor uso dos espaços litúrgicos, por exemplo. Através de uma seleção de planos mais curiosa, outra minúcia no trato dos detalhes. Levar um pouco do atrevimento do tema central até à conceção do cinema. Nesta indagação podia estar parte de uma solução que o elevasse da completa mediocridade. Uma medicina alternativa à cura de insónias com que me deparei.
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