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Porque A Arte Somos Nós

Portugal nunca foi um país inundado de prog-rock, provavelmente, porque o país estivera sob a Ditadura desde 1933. Contudo, antes dos Tantra, uma das grandes estrelas pop nacionais, José Cid, fez do melhor prog-rock em meados do final da década de 1970, com os últimos esforços da sua antiga banda Quarteto 1111 e a sua obra prima a solo, “10.000 anos depois entre Vénus e Marte”.

No entanto, Tantra foi uma das poucas bandas que conseguiu produzir música progressiva em Portugal nos anos 70. Se até 1974 a música em geral foi altamente restringida pelo regime fascista, após isso os trabalhos rock ou de vanguarda foram considerados como expressões revivalistas do ostracismo. É impossível dizer exatamente o impacto que este disco teve no cenário musical da época (demasiado jovem para isso), mas o nome “Tantra” sobreviveu como referência no rock português, mesmo durante o longo período de inatividade de 20 anos entre o terceiro e o quarto álbum.

Apesar de não serem muito conhecidos, os Tantra são altamente prestigiados por alcançarem um grau alto de musicalidade para uma banda de rock em Portugal, algo que é incomum.

O álbum de estreia da banda, “Mistérios e Maravilhas”, retrata perfeitamente as influências do rock sinfónico no início dos anos 70, mas ao mesmo tempo encontra-se uma certa qualidade experimental.

Na superfície, os Tantra soam como um cruzamento bizarro entre Gentle Giant, Yes e Genesis, mas a banda combina fácil e eficazmente o prog sinfónico com um som agressivo, energético e alto como um vulcão. Ao longo do álbum, a instrumentação está cheia de sabores analógicos de teclado e piano, sinfónicas paisagens sonhadoras, guitarras acústicas e elétricas que dão cor a todo o quadro. A interacção do baixo com a bateria é muito inteligente, com algumas faixas de apoio adoráveis e até um holofote sobre um fantástico interlúdio de percussão e bateria.

O disco é quase todo instrumental, apenas duas faixas têm letra: À Beira do Fim e Partir Sempre, curiosamente a primeira e a última faixa, respectivamente. Todas as seis faixas são excelentes, com destaque para À Beira do Fim, com teclados que conferem ao grupo uma aura espiritual, e a peculiar voz de Manuel Cardoso (também conhecido como Frodo). Tudo para dar contornos de um jazz psicadélico ao álbum. Infelizmente, a qualidade da produção é um pouco áspera e isso pode prejudicar o imenso potencial de grandeza aqui presente.

Em suma, “Mistérios e Maravilhas” mostra definitivamente que Portugal teve um prog-rock de primeira linha. O álbum está cheio de longas passagens instrumentais, carregadas de sentimento e elegância, belas melodias e uma forte carga emocional, com solos rasgados de teclados e guitarra eléctrica, e uma percussão com dinâmica multi-rítmica.

Realmente não havia (e ainda não existe) outra banda em Portugal que se compare com os Tantra, sendo que o grupo sempre se destacou não apenas pelo investimento feito nos seus instrumentos, mas também mostrou uma certa ambição em competir com o melhor internacionalmente, tanto ao nível da encenação dos concertos, como ao nível dos arranjos complexos que o próprio género exige.

Este álbum viria a ganhar reconhecimento em todo o país e, posteriormente, em todo o mundo, sendo considerado um dos melhores trabalhos musicais feitos em Portugal.

João Filipe

Rating: 3.5 out of 4.

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