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“Good Time” (2017) conta a história de Connie Nikas (Robert Pattinson), que, no meio de um assalto a um banco que dá para o torto, tem de arranjar dinheiro para tirar o seu irmão, Nick Nikas (Benny Safdie), da cadeia, antes que ele morra dentro da prisão, uma vez que tem problemas cognitivos e é alvo de preconceito. O filme é realizado pelos irmãos Safdie, Benny e Josh, que seguem esta filosofia criativa: o assunto mais casual possível pode perfeitamente ser enquadrado num filme.

Foi até Robert Pattinson, numa decisão impulsiva, que os contactou para trabalhar com ambos os irmãos. Tudo isto porque se deparou com um frame de um outro filme deles, através do qual sentiu um fascínio imenso: “Aquela imagem transmitia instinto“. No fundo, um ator como Pattinson, que sempre busca desafios, deparou-se com dois realizadores que não conseguem trabalhar sem correr riscos.

Os dois irmãos são, inclusive, extremamente detalhistas na forma como constroem as personagens, criando um background profundo da sua história e personalidade, algo que facilita imenso o trabalho dos atores em encarnar as personagens. São igualmente deveras versáteis. São eles que tratam da parte técnica, e inclusive, em “Good Time”, Benny tem uma interpretação como ator muito interessante. Além disso, todos os figurantes são pessoas reais – não figurantes, no fundo, e todo o filme tem uma energia e vibração completamente absurdas.

Connie Nikas (Robert Pattinson) e Nick Nikas (Benny Safdie)

Neste sentido, conseguimos entrar dentro da atmosfera dos dois irmãos com bastante facilidade. Com uma predominância por close-ups, criando uma sensação claustrofóbica, como se nós, espectadores – e até mesmo as próprias personagens – não tivéssemos opção a não ser mergulhar nesta viagem eletrizante. Através, inclusive, da luz e do som, extremamente bem retocadas, faz-nos levar para vários lugares (cinematográficos).

É uma proposta que prima pelo entretenimento, e que não é, de todo, rasa, pois toca em assuntos sociais muito fortes, e de forma bastante subtil. A ideia é conseguir encurralar o espectador, como que fazendo o paralelo para com a dimensão psicológica das próprias personagens em cena. Esse jogo é conseguido de forma sui generis e muito marcante. No fundo, os irmãos Safdie usam a potência da beleza cinematográfica para expor diversos problemas e mostrar que na maior parte do tempo as pessoas são simplesmente esquecidas.

Através de tudo isto e dos poucos cortes que apresenta, “Good Time” é quase a imortalização da ideia de um contra cinema, na medida em que não “abusa” dos recursos da linguagem cinematográfica, tornando-o o mais “puro” possível. É um filme intencionalmente pesado ao nível estético e muito audaz e realista quanto aos diálogos. A banda sonora é muito inquietante e tensa. Robert Pattinson tem uma excelente interpretação, com imenso carisma, dando corpo a uma personagem intensa, imprevisível, emocionalmente instável e que acha que está sempre no controlo das situações.

“Good Time” (2017)

O filme, no entanto, tem uma queda abrupta de ritmo em finais de segundo ato. Faz com que o espectador se afaste um pouco da dinâmica cinematográfica. Os takes bastante longos dão a ideia de uma espécie de documentário dark e uma montanha-russa de emoções. “Good Time” é um thriller com muita personalidade, muito dinamismo, mas que na verdade não consegue dar aquele salto em argumento necessário para ser considerado uma obra-prima.

É fascinante o que os irmãos Safdie conseguem fazer aqui, com uma marca pessoal e distintiva, mas torna-se uma produção algo vazia como um todo. A parte técnica tem uma predominância forte e bela, algo que o seu argumento não consegue acompanhar. Em matéria de motivo narrativo, está muito interessante, e as personagens apresentam um character development ainda assim muito coeso.

Logo a partir do primeiro ato, conseguimos perfeitamente entrar no universo do filme, num convite brutal e violento, repleto de crítica e carácter interventivo, onde “Good Time” se revela com um ato audaz e enérgico de rebeldia cinematográfica.

Tiago Ferreira

Rating: 3 out of 4.

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